(Continuação daqui)
266. Uma rainha
Para andar atrás dos políticos que defendiam a democracia, Salazar tinha a PIDE. O regime democrático saído do 25 de Abril, acabou com a PIDE e deu autonomia ao Ministério Público para fazer a mesma coisa - perseguir os políticos democráticos.
Entre todos os grupos socio-profissionais - académicos, economistas, engenheiros, juristas, empresários, futebolistas,etc. -, que não restem dúvidas, os políticos são os mais visados pela perseguição do Ministério Público, e a razão é que a Inquisição, que deu forma e conteúdo ao actual Ministério Público, foi criada para inviabilizar a democracia.
Políticos democráticos ou cidadãos que afirmem em público, com vigor particular os direitos fundamentais da democracia - como no caso Almeida Arroja v. Portugal, em que estava em causa o direito fundacional da democracia, a liberdade de expressão - são os alvos preferenciais do Ministério Público. E, convém dizer, os autarcas, muito mais do que os políticos de âmbito nacional.
A Inquisição não era apenas contra a democracia. Era a defensora de um poder absoluto e centralizado - a monarquia absoluta -, pelo que tudo o que diga respeito a poder descentralizado - como é o caso do poder autárquico - é um alvo a abater pelo Ministério Público. Os autarcas têm sido autênticos crivos nas mãos desta corporação criminosa e verdadeiramente fascista.
Dispondo da PIDE para perseguir os políticos democráticos, Salazar pôde dar-se ao luxo de instituir o Ministério Público como se faz nas democracias liberais, como um corpo de funcionários do Estado sujeitos à autoridade do ministro da Justiça, quer dizer, sem autonomia nenhuma. Para polícia política do regime já lhe bastava a PIDE.
Aquilo que a autonomia do Ministério Público produziu em democracia pôde ver-se na entrevista recente da PGR à RTP, sobretudo no momento em que o entrevistador lhe perguntou se, perante os erros do Ministério Público, ela sentia que devia pedir desculpa, e ela respondeu que não devia desculpas a ninguém. O Ministério Público está lá para cumprir a sua função e quanto às consequências dos seus actos, isso não lhe interessa para nada.
Ocorreu-me, nesse momento, uma analogia. O camionista que avança por uma rua cheia de pessoas esmagando toda a gente pelo caminho e que, no fim, se justifica, dizendo: "Eu só estava a cumprir a minha função - conduzir o camião". Embora a procuradora Lucília Gago parecesse mais que um camionista. Ela parecia uma verdadeira rainha, uma rainha absoluta de um Estado que vive incrustado no Estado português.
(Continua acolá)
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