(Continuação daqui)
114. A descredibilização da justiça
Se não estivesse em vigor aquela "jurisprudência de cordel" do Tribunal Constitucional (cf. aqui), segundo a qual só eram recorríveis para o Supremo as condenações inovadoras na Relação que implicassem penas de prisão iguais ou superiores a um ano - que não era o meu caso, que estava condenado em pena de multa -, é praticamente certo que o caso tinha morrido no Supremo, com este Tribunal a revogar o acórdão da Relação do Porto.
A razão é que, por essa altura (2020-21), o Supremo já tinha produzido vários acórdãos seguindo a jurisprudência do TEDH, afirmando que os tribunais portugueses estavam vinculados a segui-la e recomendando aos tribunais inferiores para a seguir (cf. aqui e aqui).
Na realidade, eu comecei por submeter o recurso ao Supremo, o qual me respondeu que não o podia apreciar por virtude da jurisprudência em vigor, emanada do Tribunal Constitucional.
E este é o ponto a que pretendia chegar - a sujeição do Supremo Tribunal de Justiça ao Tribunal Constitucional. O supremo tribunal do país deixou de ser o Supremo para passar a ser o Constitucional. E isso é uma tragédia para a justiça e para a democracia no país.
É que a maioria dos juízes do TC (sete em treze) não são juízes nenhuns, mas mandatários dos partidos, sobretudo do PS e do PSD. Quando estes partidos governam com o apoio de partidos mais pequenos, toleram que estes indiquem um "juiz" para o Constitucional. Assim, Fátima Mata-Mouros, representando o CDS, foi para o TC quando este partido apoiou o PSD de Passos Coelhos. No governo da geringonça, Clara Sottomayor (que, entretanto se demitiu) foi para o TC em representação do BE e Mariana Canotilho ainda lá está em representação do PCP.
Mariana Canotilho (cf. aqui) é aliás, representativa da maioria dos seus colegas, que não são juízes nenhuns, e que se tornam "juízes" do mais alto tribunal do país sem nunca terem feito um julgamento. São mandatários dos partidos. E, mesmo entre os seis membros do TC que são juízes, são raros aqueles que são juízes do Supremo.
Quer dizer, no Tribunal que está no vértice do sistema judicial português, que faz jurisprudência a que todos os tribunais abaixo dele têm de obedecer, incluindo o Supremo, estão, em maioria, políticos disfarçados de juízes, e mesmo aqueles que são juízes são nomeados pelo poder político.
Esta é a receita certa para a politização da justiça. A politização do Tribunal Constitucional contamina todo o edifício judicial do país. Em breve, todos os tribunais estão a decidir com base em critérios políticos e não judiciais (como o meu caso é um exemplo claro). Os dois principais atributos de uma justiça democrática - a independência e a imparcialidade dos tribunais - desaparecem e, com elas, desaparece também a confiança dos cidadãos na justiça.
Não será preciso acrescentar que este é o estado - o da descredibilização da justiça - a que já chegámos no país.
(Continua acolá)
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