O que é a cultura?
No sentido em que eu a entendo, a cultura é um conjunto de valores, crenças, atitudes e comportamentos que caracterizam um povo.
O Geert Hofstede, por ter trabalhado numa grande multinacional, a IBM, teve a oportunidade de estudar e comparar dimensões culturais de vários países e de pintar um retrato de cada um.
Estudou a Distância ao Poder, o Individualismo, a Motivação para o Sucesso, a Intolerância à Incerteza, a Orientação de Longo Prazo e a Indulgência; especialmente numa perspectiva da psicologia das organizações – que comportamento é que a gestão pode esperar dos seus colaboradores?
O retrato que tirou dos portugueses não chega para caracterizar a nossa cultura, mas ajuda.
Toleramos as desigualdades na distribuição do poder, somos mais coletivistas do que individualistas, não estamos obcecados com o sucesso, odiamos a incerteza, somos curtoprazistas e pouco indulgentes.
Tendo a subscrever esta avaliação, mas, como disse, não chega. É necessário acrescentar muito mais.
Vivemos num pequeno jardim à beira-mar, com uma longa história de independência, que nos dá raízes nacionalistas. A nossa pequenez alimentou um ideal de expansão, que se concretizou com os descobrimentos (séculos XV e XVI) e que imprimiu um carácter universalista à cultura portuguesa.
‹‹Para nascer, pouca terra; para morrer toda a terra. Para nascer, Portugal: para morrer, o mundo›› - afirmou o Pe. António Vieira (1608 – 1697). Os portugueses, de facto, adoram explorar outros países e outras culturas, mas têm saudades da sua terra.
Saudades que não os deixam assumir o presente, nem reconhecer o passado como pretérito.
O 25 de Abril não me parece que tenha alterado significativamente a cultura portuguesa (talvez isso nem fosse possível), mas abriu as portas à grande avalanche do homem massa, que cristalizou, na sua mente hermética, todas as nossas qualidades e defeitos.
A pulsão universalista, por exemplo, leva o homem massa a aceitar de forma acrítica tudo o que vem de fora, enquanto o apego à terra o leva a não aproveitar as oportunidades que surgiram com a União Europeia e com a globalização.
As características que o Ortega y Gasset vislumbrou no homem massa: conformidade, falta de curiosidade, aversão ao risco e aversão à responsabilidade, parece que encontraram terreno fértil entre nós.
Cinquenta anos após o 25/4, não estamos mais cultos nem mais civilizados. Pelo contrário, o 25/4 deu oportunidade ao homem massa de impor a ditadura da anti-cultura e da anti-razão.
As elites intelectuais passaram a ser desprezadas pelo homem massa, que julga poder prescindir das suas orientações. Será que conseguimos sobreviver à massificação? É possível que sim, com é possível que o resultado venha a ser catastrófico, não sabemos.
Neste momento, porém, parafraseando Churchill (em 1939), o nosso destino comum é “uma charada, envolta num mistério, dentro de um enigma”.
Um desafio nobre para as minorias estudarem, correndo o risco de serem esmagadas pelo ódio e violência do homem massa.
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