(Continuação daqui)
Fonte: cf. aqui
45. As sociedades de advogados
As sociedades de advogados estão muito bem representadas no próximo Governo de Luís Montenegro, Paulo Rangel e Miranda Sarmento.
Os políticos andam todos muito preocupados que um T0 ou um T1 em Lisboa ou no Porto possa custar 600 euros ao mês, mas já há sociedades de advogados a cobrar 600 euros à hora. Não é ao mês, é à hora.
O negócio não envolve matérias primas nem grandes equipamentos, como a produção de batata que requer sementes, adubos e tractores. É um simples negócio de papel e lápis ou, modernamente, de computador e dedo.
O principal promotor deste lucrativo negócio é o Estado, que o faz de duas maneiras.
A primeira - que só referirei en passant - resulta das grandiosas operações do Ministério Público, como aquela que levou às recentes eleições, que se arrastam durante anos e que são um verdadeiro maná para os advogados - verdadeiras avenças para a vida, especialmente quando os arguidos são ricos, como é o caso de Ricardo Salgado, Manuel Pinho ou Armando Pereira.
A segunda consiste na adjudicação de lucrativos contratos de assessoria jurídica pelas instituições do Estado às grande sociedades de advogados, mesmo quando os organismos públicos dispõem de departamentos jurídicos de dimensões consideráveis.
No negócio das batatas, a unidade de conta é concreta e todos a podem medir - o quilo. No mercado da assessoria jurídica, como em tudo o que respeita às profissões jurídicas, nada é exacto, tudo se esfuma na incerteza, na falta de transparência e na fluidez. A unidade de conta é a hora de prestação do serviço, cuja quantidade é difícil verificar.
Assim, só nos últimos quatro meses, o Banco de Portugal e o Ministério das Finanças adjudicaram dois contratos, por ajuste directo, à Cuatrecasas, no valor total de 4 530 000 euros (cf. aqui). A 600 euros à hora (4 800 euros ao dia), dá uma barbaridade de 7 550 horas de trabalho. Se o preço for mais "razoável" de100 euros à hora (800 euros por dia), os contrato envolvem 45 300 horas de trabalho, deixando a Cuatrecasas a trabalhar até à eternidade para estas duas instituições do Estado português.
Ficaram célebres as explicações do eurodeputado, agora ministro Paulo Rangel, na altura também director da Cuatrecasas no Porto, sobre os contratos de assessoria jurídica celebrados com a Câmara Municipal do Porto, ao tempo presidida pelos seus companheiro de partido Rui Rio.
“Desde que estou no escritório os valores e horas trabalhadas até têm registado uma diminuição”, adianta Rangel, fornecendo informação detalhada. O ano com maior actividade foi 2011, num total de 2459 horas de assessoria jurídica prestada à Câmara Municipal do Porto pelo valor de 126 045 euros. Já em 2012 é, nesta retrospectiva de cinco anos, o ano em que a sociedade teve menos participação nas actividades jurídicas da autarquia. Tiveram lugar 1547 horas de prestação de serviços, facturadas em 98500 euros". (cf. aqui)
As sociedades de advogados são um dos maiores factores de corrupção institucional do país promovendo a promiscuidade entre a política e os negócios. O cerne do meu comentário televisivo que levou ao processo que na semana passada culminou na decisão do TEDH era precisamente o da promiscuidade entre política e negócios.
E são as grandes sociedades de advogados também o maior factor de corrupção da democracia.
A maior parte dos políticos são advogados, e isto é assim no Governo - o próximo não é excepção - e na Assembleia da República, passando pela Presidência da República. Tendo um pé na política e outro na justiça, os advogados, quando reunidos em grandes sociedades, tornam-se um poder extremamente corruptivo da democracia, promovendo a judicialização da política e a politização da justiça.
Judicializando a política, as grandes sociedades de advogados aumentam a procura para os seus serviços de advocacia. Politizando a justiça, elas conseguem obter dos tribunais decisões favoráveis para os processos em que estão envolvidas, como foi claramente o caso no processo que tenho vindo a tratar e em que estou envolvido.
Convém lembrar a este propósito que os próprios magistrados do Ministério Público são advogados (advogados do Estado), embora, geralmente, com a sua inscrição suspensa na Ordem dos Advogados enquanto trabalham para o Estado. Foram eles que lançaram Portugal na embaraçosa situação política em que actualmente se encontra, e que é um maná para os advogados, quer do ponto de vista do negócio quer do ponto de vista da política, quer dos dois ao mesmo tempo.
(Continua acolá)
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