06 novembro 2023

GAZA E A BARBÁRIE

PENA CAPITAL

 

Durante a maior parte da minha vida adulta defendi a pena de morte como o instrumento mais adequado para lidar com crimes de excepcional gravidade. Na realidade, como diz Charles Krauthammer, ‹‹é difícil pensar em qualquer outra sentença, a não ser na pena de morte, para restaurar a ordem moral quando esta é brutalmente violada››.




Contudo, em 2002, mudei a minha opinião, por influência desse mesmo autor. Argumenta Charles Krauthammer que é um sinal distintivo da civilização manter a ordem com o mínimo recurso possível à violência. ‹‹Não amputamos as mãos dos ladrões, não fustigamos os pecadores em público››, nem atiramos para a fogueira os hereges. Abolir a pena de morte, pelo mesmo motivo representa um avanço civilizacional.

 

Um Estado forte, numa sociedade civilizada, pode prescindir da pena de morte enquanto mantém a ordem interna. Fui sensível à argumentação invocada e mudei de opinião.

 

Ayn Rand, outra autora que me influenciou bastante, também era contra a pena de morte. Considerava-a justificada sob o ponto de vista moral, mas desapropriada por motivos ‹‹epistemológicos››; pela possibilidade de se liquidarem inocentes ou ser usada como instrumento político (não esquecer que a Ayn Rand nasceu na URSS).

 

Contudo, a mesma Ayn Rand considerava os palestinianos (e os índios norte-americanos) como animais por assumirem comportamentos irracionais, despidos, portanto, de quaisquer direitos que atribuímos ao Sapiens. Destruí-los não só é moral, na óptica do objetivismo, como seria desejável na óptica da sobrevivência do mundo civilizado (racional).

 

Vem tudo isto a propósito do conflito em Gaza, do ataque terrorista do Hamas e da resposta do Netanyahu.

 

Sobre o ataque do Hamas há pouco a dizer porque é unânime que se trata de puro terrorismo e de selvajaria. A resposta de Israel é que divide a opinião pública: será proporcional e adequada ou é um crime de guerra punível pelo direito internacional.

 

É consensual que Israel tem direito a defender-se e que o Hamas se escuda atrás de civis, em mesquitas, hospitais e escolas, contudo, o elevado número de vítimas, levanta questões morais e políticas.

 

Serão os palestinianos simples gado que pode ser aniquilado como uma peste da civilização, numa perspectiva Randiana, ou serão seres humanos como nós, que foram apanhados num redemoinho histórico do qual não conseguem escapar?

 

A minha convicção é que a Ayn Rand estava errada. Os palestinianos, os índios norte-americanos ou os aborígenes, são seres humanos como nós e têm direito a ser tratados como tal.

 

A Escola de Salamanca, no século XVI, debruçou-se sobre este assunto e Francisco Vitória, invocando o Direito Natural, defendeu que os indígenas Americanos tinham exactamente os mesmo direitos que os Europeus: direito à vida, dignidade e propriedade.

 

Cinco séculos depois parece que continuamos a discutir um tema que me parecia assente. ‹‹Todos fomos criados iguais e com os mesmos direitos inalienáveis››.

 

Tendo invocado Charles Krauthammer, Ayn Rand e Fernando Vitória, qual é a minha conclusão?

 

A minha conclusão é que o direito à vida dos palestinianos inocentes deve ser respeitado e que quanto menos Israel recorrer à violência mais demonstrará ao Mundo a sua superioridade civilizacional. Garantindo, claro, que também está a defender a vida dos seus cidadãos.

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