Quando passeio com a Louise cruzo-me com frequência com outros canídeos e respetivos protetores que fazem questão de me contar como é que o animais entraram nas suas vidas.
Normalmente são histórias de faca e alguidar, que passam por orfanatos para Canis Lupus Familiaris, por desabrigo, por abusos e até por abandono em caixotes do lixo.
Os salvadores destas tristes vidas de cão ostentam o indisfarçável orgulho da virtude e da superioridade moral das suas ações. Os cachorros, por seu turno, carregam os estigmas do degredo: pelagem desbotada e eriçada, cabeça baixa e olhar de poucos amigos.
Felizmente que tenho uma história pronta sobre a adoção da Louise para contrapor aos meus colegas de passeios caninos.
A Louise, uma exemplar com pedigree de Bulldog Francês, foi adquirida por um casal de velhinhos, ambos com 84 anos de idade, para animal de suporte emocional, em Janeiro de 2020. Infelizmente a tragédia bateu-lhes à porta e os velhinhos contraíram Covid e faleceram, os dois no mesmo dia.
O cangalheiro falou-me do caso e eu prontifiquei-me de imediato para adotar a cadelinha, agora órfã de avós.
O CV da Louise é entendido com agrado, toda a gente me felicita pela minha boa ação e eu sinto algum orgulho, confesso, por destronar a petulante virtude dos outros, com uma história breve, mas rica em pormenores e sentimentos.
Um senhor de idade chegou a chorar, numa loja de animais ofereceram-nos biscoitos e algumas pessoas fazem comentários filosóficos que me deixam a pensar. Uma senhora de meia-idade disse-me:
— Morreram os dois no mesmo dia?
— É verdade...
— Foi melhor assim!
De facto, o que poderia ter sido pior? Os dois velhinhos morreram e deixaram uma bebé órfã, realmente. Melhor?
— Louise, ainda daí que temos de contar a tua história no Portugal Contemporâneo.
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