(Continuação daqui)
131. A frigideira
Juiz do Tribunal da Relação do Porto absolvido de difamação de magistrada
Não ficou provada autoria dos insultos dirigidos a Paula Sá no Facebook através da conta do desembargador Marcolino de Jesus. Supremo Tribunal de Justiça deixou aviso a ambos os magistrados para que refreiem os seus impulsos na litigância um contra o outro.
Fonte: cf. aqui
Para os anais da investigação criminal permanecerá para sempre como o crime mais difícil de desvendar do século XXI, um caso de criminalidade organizada em casal, um caso que é legado ao futuro como um case-study das monstruosas dificuldades que, por vezes, se levantam à moderna investigação criminal.
O caso conta-se em poucas palavras. O juiz Francisco Marcolino ofendeu - ou assim se pensava - a sua colega Paula Sá, numa rede do Facebook reservada a juízes, chamando-lhe mentirosa e desonesta.
A juíza Paula Sá pôs-lhe um processo por difamação.
Como o réu era juiz desembargador, o julgamento teve lugar no Supremo Tribunal de Justiça. Se fosse condenado, nunca ascenderia a juiz do Supremo.
Em audiência, perante um colectivo de três juízes do mais alto tribunal judicial do país, o juiz Marcolino manteve que não foi ele que escreveu os comentários, mas a esposa, que acedeu à sua conta do Facebook.
A esposa, sempre leal, sentada no banco das testemunhas, acenou afirmativamente com a cabeça e confirmou perante o tribunal que sim, foi ela. E fez tudo isto - garante quem lá estava - sem piscar o olho ao marido que estava a curta distância, sentado no banco dos réus.
Os juízes do Supremo, não vendo qualquer piscar de olho, mas fazendo prova de superior inteligência que não lembraria a um garoto de escola primária, desconfiaram que era patranha. E pediram a intervenção da Polícia Judiciária, que foi lá a casa e apreendeu os computadores do juiz e da esposa.
Não havia, no computador do juiz, nenhuma impressão digital da esposa, havia era várias impressões palmares do juiz, porque o juiz costumava digitar no computador com as palmas das mãos.
Porém, lembrando-se de um caso que tinha ocorrido há vários anos em Bragança, em que um inocente fora condenado a vinte anos de prisão somente por causa de uma impressão palmar, os investigadores da PJ, por caridade, deram a investigação por encerrada com resultados inconclusivos. Não sem antes pedirem ao juiz e à esposa para mostrarem as mãos, as palmas para cima. Estavam secas.
Inconformados, os três juízes do Supremo, sempre na procura da verdade, sem a qual não é possível fazer justiça - nem mesmo no Supremo Tribunal de Justiça -, chamaram o FBI para investigar o caso, tanto mais que o juiz Marcolino já lá tinha ficha, embora com o nome de Marehlino, e não por difamação, mas por ligações ao tráfico de droga (cf. aqui).
Porém, nem os americanos foram capazes de chegar a qualquer conclusão.
Quem é que teria escrito os impropérios à juíza Paula Sá, a partir da conta pessoal do Facebook do juiz Marcolino, que mantinha com a colega uma quezília que durava há anos?
A questão estava difícil de resolver. Nunca a investigação criminal, mesmo ao nível internacional, se tinha deparado com uma questão difícil assim.
E foi, então, que os juízes do Supremo tiveram uma ideia genial. Chamaram dois antigos inspectores da PIDE, já entrados nos 80, que imediatamente foram a casa da família Marcolino, entraram por ali dentro eram quatro e um quarto da manhã, e ameaçaram o casal que, ou confessava o crime, ou ali mesmo, em pleno leito conjugal, lhes arrancariam as unhas dos pés, uma a uma, e depois passariam às das mãos.
Mas nada. Não resultou.
Os agentes da PIDE costumavam ter uma solução de última instância, que nunca falhara para obter uma confissão. Mandaram o casal Marcolino durante três meses para o Tarrafal, directamente para a célebre Frigideira (cf. aqui), um em cada cela, a 120 metros de distância um do outro, sem possibilidade de se comunicarem, ambos devidamente desunhados.
Mas, ainda assim, ao final dos três meses, nada.
Os juízes do Supremo acabaram por se resignar e - num caso de in dubio pro reo - decidiram absolver o juiz Marcolino sob o argumento de que não tinha sido possível, nem nunca seria possível, saber quem tinha sido o autor do crime.
Cinco meses depois, o juiz Marcolino era promovido a juiz do Supremo.
(Continua acolá)
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