(Continuação daqui)
III. Sexo com menores - o legalismo
Logo que a notícia surgiu na imprensa, imputando ao cardeal patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, o encobrimento de um caso de abuso sexual de um menor, o juiz não perdeu tempo e saiu imediatamente a terreiro.
Podia lá ser, haver sexo e haver igreja e o juiz não estar presente?!...
Num artigo publicado no Observador (cf. aqui), o juiz vem outra vez relativizar os abusos sexuais sobre crianças cometidos no seio da Igreja Católica, como já havia feito meses antes, em dois artigos, na sequência da publicação do relatório da CIASE em França.
É importante, porém, notar uma nuance nos títulos dos dois artigos de então,
-"Os abusos sexuais e uma questão ética" (cf. aqui)
-"O desprezo da ética sexual e os abusos" (cf. aqui),
e no título do artigo de agora:
-"Abusos sexuais, Estado de Direito e caça às bruxas" (cf. aqui)
A diferença é que a Ética sai de cena e cede o seu lugar ao Estado de Direito, isto é, a moralidade cede o seu lugar ao legalismo. E é com base no legalismo que o juiz faz uma defesa enfática do cardeal.
Invocando a sua autoridade de juiz, diz que não existe lei no país que obrigue uma pessoa a denunciar às autoridades crimes de que tenha conhecimento. A única excepção aplica-se aos funcionários públicos e mesmo aí, só quando estão no exercício da sua função pública. Este é o argumento legalista com que o juiz absolve D. Manuel Clemente.
Mas o juiz é muito dado a questões éticas, passa o tempo a pregar - ele é um verdadeiro padre laico - e o argumento ético levanta a questão: "Então uma pessoa tem conhecimento de um crime, ainda por cima sobre uma criança, e fica calada, deixando o criminoso à solta?" .
Para salvar o amigo cardeal, o juiz muda as regras do jogo, a ética deixa de ser importante para ceder o lugar ao legalismo.
Quando, há perto de dois anos, me interroguei qual seria a palavra que escolheria se tivesse de definir o juiz numa única palavra, a resposta a que cheguei já deixava antever este resultado: cf. aqui.
(Continua)
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