23 dezembro 2021

Dez Anos (6)

 (Continuação daqui)



6. A justiça do Diabo

Quando, pouco depois de ter tomado posse como presidente do HSJ em fevereiro de 2019 (cf. aqui), eu soube que o Dr. Fernando Araújo se tinha ausentado de urgência para os EUA para ir acompanhar um filho que se encontrava internado num hospital em estado grave, fiquei momentaneamente sem saber o que pensar.

Justiça Divina não podia ser, porque Deus não faz mal a ninguém. Talvez fosse a justiça do Diabo.

Fernando Araújo era o director do Serviço de Sangue do Hospital de São João quando a Associação Joãozinho começou a obra em Novembro de 2015 - Serviço de Sangue cuja não deslocalização viria a bloquear a obra do Joãozinho, prolongando a estadia das crianças nos contentores metálicos por mais de três anos.

Pouco depois, juntou-se ao governo da geringonça como Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, lugar a partir do qual continuou a bloquear a obra da Associação Joãozinho. De todas as vezes que pretendi falar com ele para desocupar o Serviço de Sangue a fim de que a obra pudesse continuar, fugiu sempre, remetendo-me  para o Secretário de Estado da Saúde, Manuel Delgado, e para o Ministro Adalberto Campos Fernandes, com os quais falei várias vezes, mas sempre sem resultado.

Acabei por me encontrar com o Dr. Fernando Araújo já no final de 2018 - a obra estava bloqueada há dois anos e meio -, nas instalações do HSJ e a reunião não correu nada bem. Perante a minha acusação de que ele e o Ministério da Saúde andavam a mentir à opinião pública sobre a ala pediátrica do HSJ, ele sorriu com a cara estanhada própria de um adolescente e admitiu, em relação a uma das mentiras "Essa, de facto, saiu muito mal" (cf. aqui: "O Blunder da Comissão").


"Os corta-fitas de hoje foram os maiores entraves do passado"

No último dia 12, na inauguração da ala pediátrica do HSJ, Fernando Araújo, na qualidade de presidente do Hospital, era um dos corta-fitas presentes (cf. aqui). A ele se aplica de forma paradigmática a afirmação de Jorge Pires, segundo a qual "Os corta-fitas de hoje foram os maiores entraves do passado". 

Durante três anos e meio, por entre os vários políticos do PS e do PSD que boicotaram a obra da ala pediátrica que estava a ser realizada pela sociedade civil, ele teve uma posição de destaque, primeiro como director do Serviço de Sangue, depois como secretário de Estado Adjunto e da Saúde e finalmente como presidente do Hospital. 

Foi ele que, no final de 2019, depois de ter contribuído para bloquear a obra por mais de três anos, escreveu à Associação Joãozinho a dizer que, nos termos do Protocolo assinado, tendo-lhe o HSJ cedido o espaço por três anos e não tendo a Associação realizado a obra, que levantasse o estaleiro e se fosse embora.

Por isso, aquele episódio do internamento do filho num hospital americano teve um significado especial. Nesse momento, ele deve ter sentido na pele o que era ter um filho internado num hospital em estado grave. Provavelmente, o filho esteve internado num hospital de luxo e por pouco tempo. Ao passo que, em parte pela sua acção prolongada, os filhos do povo português estiveram internados em miseráveis barracões metálicos durante dez anos.

Não, não pode ter sido a justiça Divina. Só pode ter sido a justiça do Diabo.

(Continua) 

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