14 março 2021

Um grande bando de ladrões (10)

 (Continuação daqui)

"Um Estado que não se regesse
 segundo a justiça, reduzir-se-ia
 a um grande bando de ladrões."
S. Agostinho

10. Aquilo em que é especialista

No episódio que relatei no post anterior, o Ministério Público, chefiado pelo procurador Deltan Dallagnol, age como uma associação de criminosos ao serviço do Estado brasileiro.

O Ministério Público consegue saquear a Petrobrás - que não cometeu crime nenhum no Brasil - em 700 milhões de dólares, que revertem a favor do Estado e em que os procuradores ambicionam cobrar uma comissão (sob a forma de honorários em conferências), embora, desta vez, essa pretensão tivesse saído gorada.

O Ministério Público é a versão moderna da Inquisição que Portugal levou para o Brasil. A Inquisição era também uma associação criminosa dentro da Coroa portuguesa que, sob o argumento da infidelidade ao catolicismo, se especializava em perseguir e confiscar o património das pessoas abastadas, com o produto do roubo revertendo para a Coroa, e os inquisidores recebendo uma parte a título de prémio ou comissão.

Os alvos preferenciais da Inquisição eram os cristãos novos e as razões são fáceis de compreender. Os cristãos novos eram os judeus convertidos ao catolicismo, acerca dos quais era, portanto, fácil pôr em causa se a sua conversão teria sido genuína. 

Depois, os judeus tendo atrás de si um longa história de perseguição e de expulsão dos lugares onde viviam, possuíam uma tradição de manter a sua riqueza em forma líquida (dinheiro e outros bens líquidos, como depósitos bancários), permitindo-lhes transportar facilmente consigo o seu património quando eram expulsos ou tinham de fugir.

Portanto, para a Inquisição, perseguir e confiscar os judeus era dinheiro em caixa, não só porque os judeus eram ricos, como também porque tinham o seu património predominantemente em dinheiro, e não em activos ilíquidos (v.g., propriedade imobiliária).

Esta mesma tendência da Inquisição para se concentrar em alvos onde o dinheiro reluz encontra-se hoje no Ministério Público. Se antes os alvos eram os judeus, hoje são as grandes empresas capitalistas, como a Petrobrás ou a Odebrecht no Brasil, o Grupo Espírito Santo ou o Grupo Lena, em Portugal; se antes o pretexto era a heresia religiosa, hoje é a corrupção, através de Operações como a Lava Jato, no Brasil, ou a Operação Marquês, em Portugal; se antes, os inquisidores eram padres, hoje são sobretudo juristas, como Deltan Dellagnol no Brasil, ou Rosário Teixeira, em Portugal. 

Num artigo de 2018 da BBC-Brasil com o título sugestivo "Lava Jato: MPF recupera R$11,9 bi, mas devolver todo o dinheiro às vítimas pode levar décadas" (cf. aqui, ênfase meu), o Ministério Público Federal (MPF) dá conta que, entre acordos e arrestos de bens dos arguidos, já tinha recuperado 11,9 biliões (mil milhões) de reais no âmbito da Operação Lava Jato. Por essa altura, este dinheiro já estava em poder do Estado brasileiro.

Porém, quanto ao Estado brasileiro devolver o dinheiro às vítimas dos alegados actos de corrupção, isso é que iria demorar muitas décadas porque o dinheiro só poderá ser devolvido depois de esgotados todos os recursos dos processos judiciais em que o dinheiro está envolvido. 

Como o Brasil herdou também de Portugal uma imensa lentidão da justiça (et pour cause...), isso quer dizer, na prática, que esse dinheiro nunca será devolvido a ninguém e é o Estado brasileiro que irá ficar com ele para sempre.

O Ministério Público Federal terá, então, consumado, aquilo em que é especialista - agir como um grande bando de ladrões ao serviço do Estado brasileiro.

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