23 fevereiro 2020

A manipulação da justiça (IV)

(Continuação daqui)


No caso que recentemente veio a público, as regras aleatórias da distribuição dos processos foram violadas pelo presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, que encaminhou um processo para certos juízes favoráveis a uma das partes, em detrimento da outra (cf. aqui).

Como é que as coisas no Tribunal da Relação do Porto se teriam passado se o presidente ou um funcionário de secretaria com influência na distribuição dos processos tivesse sido falado para obter a minha condenação (cf. aqui)?

Vou colocar-me na posição dessa pessoa. Seria tudo muito simples.

Embora o TRP tenha sido um dos primeiros tribunais superiores do país a adoptar a jurisprudência do TEDH quando está em causa o conflito entre os direito à liberdade de expressão e o direito à honra, ainda há juízes naquele tribunal que recusam fazê-lo. Estes juízes são obviamente conhecidos dos seus colegas e podem ser conhecidos de qualquer cidadão que se dê ao trabalho de estudar os seus acórdãos nesta matéria ou a sua vida pública.

A primeira coisa que eu faria, se tivesse influência na distribuição dos processos no TRP, e quisesse condenar o arguido, seria enviar o processo para a primeira secção criminal (cf. aqui). O juiz que preside a esta secção decide sempre contra a jurisprudência do TEDH. A razão é que ele é uma espécie de campeão dos processos por ofensas por virtude dos quais terá enriquecido substancialmente ao longo da sua vida. Ele não pode absolver o ofensor sob pena de esvaziar todos os processos em que ele próprio se apresenta como ofendido.

Agora, vou colocar-me na posição deste juiz-presidente que tem de distribuir o processo a dois juízes (relator e adjunto) da sua secção. Para dar uma aparência de imparcialidade, escolheria a juiz Paula Guerreiro, que ele sabe decide sempre segundo a jurisprudência do TEDH, e o juiz Pedro Vaz Pato que, por razões ideológicas e religiosas, ele sabe que decide sempre contra a jurisprudência do TEDH.

Na realidade, o juiz-presidente da primeira secção sabe uma coisa mais. Sabe que estes dois juízes não se vão entender e que ele próprio será chamado a desempatar.

A condenação está garantida.

Tudo simples. De maneira aleatória é que teria sido muito difícil isto acontecer.

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