3. A aguardar a reforma
Foi um daqueles dias em que as pessoas acordam sobressaltadas com as notícias vindas da loja da Dra. Raquel, envolvendo buscas, uma dúzia de magistrados do Ministério Público, uns quantos juízes de instrução a comandar dezenas de agentes da PJ, e umas tantas detenções de figuras públicas.
Nesse dia de Maio tinham sido detidos dois presidentes de Câmara, a mulher de um deles e o presidente do IPO do Porto e a Operação chamava-se Teia. Todos passaram uns dias na cadeia até serem ouvidos pelo juiz de instrução criminal do Porto (cf. aqui e aqui).
Um presidente de câmara e o presidente do IPO tiveram de se demitir para não ficarem em preventiva, mas só sairiam depois de pagar uma caução avultada. A mulher do primeiro e o segundo presidente de câmara ficaram em prisão domiciliária, com pulseira electrónica. E assim ficaram o Verão inteiro. A crimalhada envolvia uns tráficos de influências, uns favores e umas cunhas.
Tudo crimalhada fabricada numa oficina da loja da Dra. Raquel chamada Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) do Porto. Embora o produto acabado tivesse vindo a público já sob o novo director, a maior parte do processo de fabrico terá ocorrido sob o antigo director, o célebre magistrado Y, que ocupou o lugar até Setembro de 2018.
Os advogados de defesa não se conformaram e apelaram para a Relação do Porto. E é aqui que é preciso fazer um esforço para expor o que se passou.
Todos os actos processuais das investigações (buscas, escutas telefónicas, etc.) tinham sido autorizados por um juiz de instrução criminal do Porto.
Ora, acontece que, quando os crimes são praticados em comarcas sob a jurisdição de Tribunais da Relação diferentes, a competência para autorizar os actos processuais transita para Lisboa para um juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal. E tinha sido esse o caso, os crimes foram praticados no distrito do Porto (sob a jurisdição do Tribunal da Relação do Porto) e em Barcelos, distrito de Braga (sob a jurisdição do Tribunal da Relação de Guimarães).
Por outras palavras, todos os actos processuais autorizados pelo juiz de instrução criminal do Porto, e toda as alegadas provas recolhidas através deles, foram anulados e o processo remetido para Lisboa para ser começado de novo. Os arguidos em prisão domiciliária foram imediatamente libertados (cf. aqui).
O magistrado Y e os seus rapazes andaram anos a trabalhar para o boneco. Não tinham autorização para produzir aquela crimalhada toda. Se se tivessem limitado aos crimes cometidos só no distrito do Porto, muito bem, mas foram produzir crimes também para Braga e aí estragaram tudo. Saíram fora da região demarcada, um caso de imperialismo regional do Porto que, a nível nacional, o Porto tanto critica a Lisboa.
Como diz o advogado de um dos arguidos: "Este acórdão vem destruir e quase deixar em pó as promoções do DIAP do Porto e do TIC do Porto" (cf. aqui). Na verdade, que grande flop do magistrado Y. Se fosse numa empresa privada, teria sido imediatamente despedido por incompetência. Assim, terminou calmamente a sua comissão de serviço no DIAP e foi-se juntar à Dra. Raquel na Procuradoria Geral Distrital do Porto, que funciona nas instalações do Tribunal da Relação, a aguardar tranquilamente a reforma (cf. aqui).
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