No post anterior procurei ilustrar um elemento da cultura portuguesa profundamente anti-liberal e que torna o liberalismo - tal como protagonizado pela Iniciativa Liberal - de muito difícil sucesso no nosso país.
Trata-se de que qualquer iniciativa social inovadora, que não tenha o beneplácito dos poderes políticos instituídos, será prontamente atacada e os seus autores perseguidos. A instituição de que os poderes instituídos se servem para este fim é o Ministério Público.
Pretendo neste post olhar esta mesma faceta anti-liberal da cultura portuguesa, mas pelo outro lado da moeda. Trata-se agora de mostrar que as únicas iniciativas sociais que prosperam no país são aquelas que têm a aprovação do Governo.
Por outras palavras, existe na cultura portuguesa um elemento anti-liberal que leva os portugueses, sempre que promovem qualquer iniciativa social de relevo, a irem buscar os governantes para a apadrinhar. E se não conseguem o apadrinhamento por parte dos governantes, desanimam, consideram a iniciativa um falhanço e desistem dela.
Por que será assim, por que é que os portugueses têm tanta necessidade de obter a aprovação dos seus políticos para tudo aquilo que se propõem fazer de socialmente relevante? E por que é que esta característica cultural é profundamente anti-liberal?
Começarei por invocar um exemplo neste post, para dar a resposta a estas questões no próximo.
O exemplo é uma associação de beneficência que visa afastar mulheres da prostituição, que se chama O Ninho, e que há cerca de dois anos comemorou 50 anos de actividade. A associação está ligada à Igreja Católica
Para comemorar o cinquentenário da instituição foram organizados vários eventos, incluindo uma conferência. No prospecto de divulgação da conferência há dois aspectos que imediatamente chamam a atenção de um liberal (cf. aqui).
O primeiro é a completa ausência de prostitutas ou de proxenetas do painel dos conferencistas para virem dizer, com conhecimento de causa, aquilo que afecta a actividade. Em lugar das prostitutas e dos proxenetas, aparecem uns senhores e uma senhoras, todos com algum título - mas nenhum com o título de prostituta ou proxeneta - a falar paternalisticamente sobre umas e outros. Há mesmo um painel dedicado à Análise de Especialistas embora não seja claro como é que os especialistas se especializaram.
O segundo aspecto - e o mais importante para o meu propósito presente - é a quantidade de políticos que estão envolvidos no evento. Na realidade, neste evento, a associação O Ninho conseguiu unir aquilo que a democracia se esforça por separar, que são os três poderes do Estado (e também o Estado e a Igreja).
Estão lá representados o poder executivo, o poder legislativo (nacional e europeu) e ainda o poder judicial, porque também lá está um juiz.
A pergunta que ocorre poderia pôr-se em relação a qualquer um dos figurantes, mas vou concentrá-la na figura de um deles, talvez o mais representativo deles todos:
-O que é que lá está a fazer o primeiro-ministro? Ele também percebe de prostituição?
A resposta a esta questão é o tema do próximo post.
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