A figura que neste evento da associação O Ninho (cf. aqui) o primeiro-ministro foi convidado a desempenhar é a figura do padrinho.
Dito isto, eu estou agora em condições de começar a responder às questões que formulei no post anterior, começando por dizer que o padrinho é uma figura distintiva da cultura católica, que é a cultura portuguesa, e que não existe semelhante figura na cultura do cristianismo calvinista que deu lugar ao liberalismo.
Perguntar-se-á se uma cultura, como a nossa, que é católica e tem padrinho, fará muita diferença de uma cultura calvinista e liberal, que não tem padrinho. A resposta é sim, faz um mar de diferença.
O padrinho, como o próprio nome sugere, é um segundo pai, na realidade o homem que substitui o pai natural por morte, invalidez ou outra incapacidade deste. Tal como o pai, é uma figura de autoridade, embora uma autoridade distante e, por isso mesmo, mais benevolente.
Nenhum de nós escolhe o pai que tem, mas são os nossos pais que escolhem o nosso padrinho. Querendo o melhor para nós, normalmente eles escolhem para nosso padrinho um homem de posses, que nos possa sustentar com razoável desafogo no caso de eles nos faltarem.
Do padrinho qualquer criança espera uns bons presentes e até uma nota, pelo menos no dia do seus anos. E, mais tarde, como adolescente ou jovem adulto, o padrinho é a pessoa certa para meter uma cunha para nos arranjar emprego ou para que possamos assentar praça num quartel próximo da nossa casa.
É muito diferente a perspectiva da criança, do adolescente e do jovem adulto que segue pela vida fora sem a ideia de um padrinho. Se os pais lhe faltarem, é ele próprio que terá de se fazer à vida pelos seus próprios meios.
A protecção que o padrinho confere na cultura católica a qualquer jovem - que é uma protecção sobretudo económica porque para as outras formas de protecção está lá a madrinha - não existe na cultura liberal, herdada do calvinismo.
Esta é uma cultura desprotegida onde, por isso, cada pessoa se torna adulta mais cedo. Pelo contrário, na cultura católica, a figura do padrinho permite prolongar a criancice e a adolescência a qualquer pessoa.
É claro que sendo o padrinho uma figura de autoridade, o afilhado não retira só os benefícios da sua protecção. Também tem deveres. Deve-lhe respeito e tem de lhe prestar contas e, por isso mesmo, quem tem um padrinho fica com a sua liberdade coarctada. Pelo contrário, nada disto acontece na cultura liberal onde não há padrinhos.
Aquilo que a associação O Ninho pretendeu obter ao convidar o primeiro-ministro para padrinho, foi, em primeiro lugar, aprovação para aquilo que tem vindo a fazer ao longo dos anos, numa manifestação de respeito para com a autoridade do padrinho. Mas ninguém quer ter um padrinho somente para isso. Ambiciona-se ter um padrinho - e um padrinho de posses - sobretudo pela protecção que ele dá.
O primeiro-ministro não é o único padrinho da associação O Ninho. A Comissão de Honra não é mais do que uma extensa lista de padrinhos e madrinhas da associação. E nota-se que os padrinhos e as madrinhas são sobretudo políticos ou familiares de políticios.
É caso para perguntar: Para além do primeiro ministro, porque é que a associação O Ninho necessita de tantos padrinhos e tantas madrinhas? Que necessidade especial de protecção tem a associação O Ninho para ter tantos padrinhos e tantas madrinhas? E por que é que os padrinhos e as madrinhas são quase todos políticos, ou familiares de políticos, e não se vê lá uma prostituta reformada, um frade franciscano, um artista de rua ou um proxeneta arrependido?
Veja a reposta no próximo post.
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