Eu acabo de ser condenado no Tribunal da Relação do Porto (cf. aqui) por crimes que não existem na maior parte dos países democráticos que subscreveram a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH).
Trata-se dos chamados crimes contra a honra (difamação, ofensa a pessoa colectiva, injúria, calúnia).
Ao longo dos últimos anos, o Conselho da Europa - que administra a CEDH e do qual faz parte o TEDH - tem vindo a insistir junto dos países membros - Portugal é um deles -, para descriminalizarem as ofensas à honra. E ainda recentemente fez mais um apelo (cf. aqui).
A razão é que nos países como mais frágil tradição democrática (como são notoriamente países como, por exemplo, Portugal ou a Rússia) os crimes contra a honra são utilizados pelo poder político para limitar a liberdade de expressão e calar a oposição.
Por outras palavras, os crimes contra a honra são o veículo por excelência dos chamados processos políticos, aqueles em que o sistema de justiça é instrumentalizado para fazer política .
As coisas correm tipicamente assim. Um jornalista ou um comentador afirma que existem suspeitas de corrupção no gabinete do político X. O político apresenta uma queixa-crime por difamação. O jornalista ou comentador acaba, por vezes, condenado porque os tribunais nacionais violam a jurisprudência do TEDH.
Resultado: nunca mais ninguém no país levanta suspeitas de corrupção sobre os políticos. E a corrupção no país vai reinar à vontade. Quem diz corrupção diz qualquer outro comportamento impróprio por parte dos políticos (v.g., situações de conflito de interesses).
A Rússia e a Turquia, pela sua dimensão e a sua frágil tradição democrática, são os países onde mais frequentemente a criminalização da honra é utilizada para calar os opositores políticos. Mas ajustando pela população, Portugal não lhes fica atrás. É o país mais vezes condenado pelo TEDH por violações do direito à liberdade de expressão (isto é, os tribunais portugueses condenam um cidadão por algum crime contra a honra e depois o TEDH condena o Estado português por o ter feito).
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