04 março 2019

Neto de Moura e a Liberdade (I)



I. Oxalá



Desde há alguns meses que desejaria escrever sobre o juiz Neto de Moura e o caso que o envolve, mas impedia-me um conflito de interesses, que vou expor agora para poder prosseguir.

Não sem antes dizer que, logo que o caso explodiu em público, eu senti uma simpatia íntima por ele. O Bloco de Esquerda iniciara o presente mandato legislativo onde, pela primeira vez, tinha tido acesso a um naco de poder, atirando-se a mim e procurando assassinar-me o carácter. Acabava o mandato fazendo o mesmo ao juiz Neto de Moura.

Coincidente com a entrada em funções deste Governo entraram duas queixas contra mim no Ministério Público. Uma do Bloco de Esquerda, através de CIG (Comissão para a Igualdade do Género) e outra da sociedade de Advogados Cuatrecasas, ligada ao PSD.

O Ministério Público, sempre pronto a fazer favores ao poder político do momento, que é quem paga aos seus funcionários, terá achado que dois julgamentos era demais para um homem só. Lá escolheu a segunda queixa que disfarçava melhor o carácter político do julgamento a que fui sujeito, faz agora um ano.

Nesse julgamento, eram queixosos a sociedade de advogados Cuatrecasas, imputando-me o crime de ofensa a pessoa colectiva, e o seu director, Paulo Rangel, imputando-me o crime de difamação agravada. Além das penas que, no limite, podiam ir até 3 anos de prisão, reclamavam de mim indemnizações de 50 mil euros cada, num total de 100 mil euros.

Estes casos decidem-se pelo confronto entre o direito ao bom nome do ofendido e o direito à liberdade de expressão do ofensor. A jurisprudência é estabelecida pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e é esmagadoramente em favor da prevalência do direito à liberdade de expressão.

O juiz do Tribunal de Matosinhos lá conseguiu fazer parte do seu trabalho - que é o de fazer justiça - e absolveu-me do crime de difamação agravada. Mas não conseguiu fazer o trabalho todo, talvez pelo peso excessivo das testemunhas de acusação (cf. aqui), e condenou-me pelo crime de ofensa a pessoa colectiva.

Recorri para o Tribunal da Relação do Porto e o recurso está a ser apreciado. Muitas vezes pensei: "Oxalá seja o juiz Neto de Moura o relator do processo". É que, no recurso, eu (na realidade, a minha advogada, embora a pesquisa dos acórdãos tenha sido feita por mim) cito precisamente um acórdão do juiz Neto de Moura que põe a nu o erro de jurisprudência em que incorreu o juiz-de-primeira instância e que, em consequência, me absolve (cf. aqui).

Está explicado o meu conflito de interesses, embora eu deva acrescentar que, das três possíveis decisões do Tribunal da Relação do Porto a meu respeito, a saber, (i) confirmar a condenação; ii) absolver-me; iii) mandar repetir o julgamento, a que eu gostaria mais não é a segunda, mas a terceira.

Oxalá me faça a vontade. Só para ver se o juiz de primeira-instância do Tribunal de Matosinhos continuaria a acreditar nas patranhas que lhe foram contadas pelos advogados da Cuatrecasas da primeira vez.

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