17 novembro 2018

Escrever sobre o futuro (I)


(Tema: Joãozinho)


I. Em modo-morto

Não é muito fácil escrever sobre o passado. Mas escrever sobre o futuro é bastante mais difícil. Não obstante, é isso que eu vou fazer a seguir.

Partindo da informação e das expectativas que tenho neste momento, vou partilhar com o leitor aquilo que penso vai acontecer a respeito da ala pediátrica do HSJ durante os próximos meses.

Depois de ter bloqueado a obra do Joãozinho em Março de 2016, o Governo e a Maioria Parlamentar (GMP) que o apoia começaram a anunciar que iriam construir a ala pediátrica do HSJ pela via pública.

Ao mesmo tempo, o GMP ignorava ostensivamente a Associação Joãozinho e a sua obra e, com a cooperação de políticos da oposição, unidos na mesma finalidade, começaram a criar o fantasma a que me referi em baixo (cf. aqui).

O momento alto da tentativa de matar definitivamente o fantasma ocorreu durante o julgamento a que o fantasma foi sujeito este ano por ofensas à sociedade de advogados Cuatrecasas (assessora jurídica da administração do HSJ) e ao seu director Paulo Rangel.

Na realidade, o julgamento acabou por durar quatro meses e foi sobretudo um julgamento sobre a obra do Joãozinho. A vida do fantasma e da sua Associação foram devassadas, a obra do Joãozinho foi ridicularizada, o fantasma passou por louco em Tribunal - tudo com o objectivo de matar o fantasma e a sua obra.

Mas o fantasma sobreviveu. Foi neste momento que ele se tornou um verdadeiro fantasma. Aos olhos dos políticos, estava morto. Mas havia quem acreditasse que ele estava vivo, a começar por ele próprio.

Desde Abril, quando Jorge Pires, agora presidente da Associação de Pais, veio a público denunciar as condições de internamento pediátrico no HSJ, e durante os meses que se seguiram, o fantasma permaneceu em modo-morto. Nem os políticos nem os jornalistas, quando se referiam à ala pediátrica do HSJ, falavam dele.

Tudo mudou há duas semanas atrás. O fantasma apareceu mesmo. Foi no programa Sexta às 9 da RTP. Dias depois, o fantasma apareceu até de uma forma explosiva em declarações do Presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira (cf. aqui). O fantasma estava agora em modo-vivo.

Ora, o que é que acontece a quem vê um fantasma?

Fica assustado, fica com medo, às vezes em terror.  E os políticos, especialmente os do GMP,  ficaram em pânico (um post no Portugal Contemporâneo terá contribuído para isso, cf. aqui).

Era necessário, imediatamente,  voltar a pôr o fantasma em modo-morto, e o Presidente Rui Moreira terá recebido enormes pressões para não voltar a dar vida ao fantasma. Pelo caminho, os políticos procuraram boicotar um debate no Porto Canal em que estaria presente o fantasma.

A duas horas do início do Programa, para o qual tinham sido convidadas várias entidades oficiais, todas declinando, o Bastonário da Ordem dos Médicos  - que já tinha confirmado e que nunca tinha faltado a um convite do Porto Canal - cancelou a sua presença sob o argumento de que "não estava presente ninguém do Governo". Tudo por causa do fantasma. Ninguém queria manter o fantasma em modo-vivo. O debate esteve para ser cancelado à última da hora, mas acabou por ir para a frente (cf. aqui).

No dia seguinte, o PS arrastou o Presidente Rui Moreira a votar uma recomendação ao Governo para fazer a obra com financiamento público e por ajuste directo. E ontem, entre as cerca de mil propostas de alteração orçamental que deram entrada no Parlamento, pelo menos duas (PS e CDS) respeitavam à ala pediátrica do HSJ.

Ambas as propostas sugeriam ao Governo que a obra fosse inscrita no OE (mesmo se o Primeiro-Ministro tinha dito há três semanas que ela já lá estava), e uma das propostas - a do PS -, recomendava que fosse feita por ajuste directo, algo que a Ministra da Saúde tinha descartado há menos de duas semanas atrás.

Qualquer destas iniciativas visava transmitir à opinião pública a impressão de que todos os políticos, e o GMP em particular, estão profundamente empenhados em fazer a obra -  fazê-la com dinheiros públicos e o mais depressa possível.

Mas, sendo o ajuste directo impossível, e estando o projecto de arquitectura em trabalho de revisão, nenhuma delas permite que a obra possa começar antes de decorridos pelo menos dois anos, isto é, muito para além da presente legislatura.

Ter-se-á então cumprido um dos principais objectivos deste Governo e da Maioria Parlamentar que o apoia - não deixar que a obra da ala pediátrica do HSJ se inicie nesta legislatura.

Porém, é certo que a onda mediática desta semana, centrada sobre a recomendação ao Governo aprovada na CMP e nas propostas de alteração orçamental no Parlamento, criando a ilusão em contrário, veio pôr de novo o fantasma em modo-morto.

Até quando?

(Continua)


1 comentário:

dfrodrig disse...

Até que o povo comece a sair à rua, como em França, fartos de não serem repesentados.