10 setembro 2018

tem de ser

Eu vou aproveitar o balanço que me deu o post anterior para voltar ao meu case-study (cf. aqui) e tratar um tema que não tencionava tratar tão cedo.

No post anterior, referi que o Ministério Público, tal como está instituído em Portugal, gozando de autonomia e impunidade e não respondendo perante ninguém, é o maior inimigo da democracia, e acabará por dar cabo dela.

Não apenas porque é livre de acusar falsamente, normalmente figuras públicas, a maior parte das quais são políticos, e assim destruir a credibilidade da democracia, mas também porque é o órgão mais castrador do espírito democrático - um espírito caracterizado pela discussão livre das ideias e a liberdade pública de opinião - impedindo que ele floresça, sobretudo nos países que mais necessitam dele, porque nunca o tiveram, como é o caso de Portugal.

Suponha que um jovem ouviu este meu comentário no Porto Canal (cf. aqui) e depois lê esta notícia no jornal (cf. aqui). O que é que ele vai concluir?

Ele vê o comentário, é capaz de notar que o autor está zangado, mas não vê lá crime nenhum. Mas o que ele sabe também é que o autor foi condenado em tribunal. A conclusão para ele é óbvia: "É perigoso falar em público em Portugal".

Este jovem nunca vai ter um espírito verdadeiramente democrático, ele nunca contribuirá para a formação de uma opinião pública sólida, afirmativa e, se necessário, contundente no seu país, como é próprio de uma democracia. A razão é simples: ele vai ter medo de emitir opinião em público. Este país viverá para sempre democraticamente atrofiado, e assim também o espírito dos seus habitantes.

Falei de um jovem. E se for um adulto? Muito pior, porque esse, muito provavelmente, tem em casa uma família para criar.

Foi o Ministério Público que transformou este comentário televisivo em crime e o levou para o tribunal. A instâncias, curiosamente, de um político democrata, mas que de democrata só parece ter o nome.

Uma questão que era política e a ser debatida no espaço público, tornou-se uma questão judicial. Judicializou-se a política, a política penetrou no sistema de justiça pelo canal inevitável que liga uma à outra - o Ministério Público. O resultado vai ser uma justiça politizada. É de prever que a sentença que daqui vier a sair vai ter a sua dose de política. Não há nada que mais contribua para o desprestígio da justiça.

Houve verdadeiramente crime como noticiaram os jornais?

Ora, esta é precisamente a questão a que eu preferia não ter de responder agora,  antes deixar que fossem outros a respondê-la por  mim, porque o assunto está agora entregue ao Tribunal da Relação do Porto (TRP).

Mas apesar do meu esforço de contenção ao longo dos últimos três meses, está visto que não resisto, tanto mais que o TRP vai demorar meses a decidir, porque estes são processos de lana-caprina e ele tem lá processos mais importantes para resolver.

Houve verdadeiramente crime ou, como se diz no texto desta petição (cf. aqui), eu fui condenado por coisa nenhuma?

Não, não houve crime nenhum. Fui condenado por coisa nenhuma.

Eu vou comentar a sentença. Por atenção ao juiz, faço-o com a maior relutância. Mas tem de ser.

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