10 março 2018
Comunidade e Seitas
Cristo veio legitimar César. Não surpreende que o cristianismo se viesse a tornar a religião oficial do Império Romano. Cristo veio legitimar também todos os regimes políticos de autoridade pessoal - como as monarquias absolutas - que viriam a surgir mais tarde na Europa, desde que orientados para o bem-comum.
Até à emergência do protestantismo no século XVI, que marca o início da modernidade. Aquilo que caracteriza, em primeiro lugar, o protestantismo é a contestação da autoridade do Papa, e o regresso à autoridade da Lei (o princípio protestante "Sola Scriptura", que imita idêntico princípio do judaísmo, embora as Bíblias judaica e protestante sejam diferentes).
Tal como as seitas ou partidos do judaísmo, também o protestantismo cristão vai ter seitas ou partidos, as mais importantes sendo o luteranismo e o calvinismo, as quais, em breve se multiplicariam aos milhares, mantendo apenas uma característica em comum: a contestação da autoridade do Papa.
Pelo contrário, a Igreja Católica mantém o sentido comunitário da mensagem cristã que visa tornar o mundo uma verdadeira comunidade ligada pelos sentimentos de amor ao próximo entre os homens, sendo o Papa a figura de unidade e a sua autoridade.
O protestantismo retorna à primazia da Lei como fonte de autoridade, imitando o judaísmo. Da cultura luterana vai sair a ideia do Estado de Direito (Alemanha). Antes, da cultura calvinista já tinha saído a ideia de The Rule of Law (Reino Unido).
Kant é o filósofo do protestantismo. Ele apela ao homem para se libertar das peias da autoridade e ousar viver de acordo com a sua própria razão. Ele declara também que não se pode chegar a Deus pela razão. Segue-se que, no debate racional, Deus não interessa - é como se Deus não existisse (etsi Deus non daretur).
O debate racional é um debate laico. Em breve, surgem duas grandes religiões laicas, que são as ideologias. O liberalismo ou capitalismo é o calvinismo sem Deus. O socialismo, que vem depois, é o luteranismo sem Deus.
O país onde pela primeira vez se encorajou o homem a pensar pela sua própria cabeça, liberto das imposições, das restrições e dos preconceitos da autoridade, vai ser, no século XX, o centro de duas grandes guerras mundiais que, pela primeira vez, e de uma só vez, ameaçam exterminar a humanidade. Antes, já tinha sido o centro daquela que é por vezes considerada a primeira grande guerra mundial - a Guerra do Trinta Anos (dez milhões de mortos é a estimativa)
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