Portugal subscreveu a Convenção Europeia dos Direitos do Homem em 1978 e, ao fazê-lo, o Estado português obrigou-se a respeitar as decisões do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) - um Tribunal, sediado em Estrasburgo, que está administrativamente dependente do Conselho da Europa.
A Convenção refere-se ao direito à liberdade de expressão no seu célebre artigo 10ª sobre o qual o TEDH tem produzido uma vasta e interessantíssima jurisprudência no decurso das sentenças que tem proferido nesta matéria, normalmente para dirimir conflitos entre o direito à liberdade de expressão e o direito à honra.
Por razões que não são difíceis de explicar - e que tratarei noutra ocasião - Portugal foi um dos países cujos tribunais mais demoraram a absorver a jurisprudência do TEDH nesta matéria, e por isso é um dos países cujo Estado mais vezes foi condenado por restrições à liberdade de expressão (i.e., os tribunais portugueses decidem a favor do direito à honra e, quando o caso chega ao TEDH, este inverte a decisão a favor do direito à liberdade de expressão).
Nos últimos 15 anos têm sido feitos progressos consideráveis nesta matéria e os tribunais portugueses têm vindo a submeter-se à jurisprudência imposta pelo TEDH. E, dentre todos os acórdãos de tribunais superiores portugueses a que tive acesso, o meu preferido é exactamente um acórdão de 2007 do Tribunal da Relação do Porto (*).
Trata-se de um caso em que um jornalista (Augusto Seabra) publicou um artigo crítico sobre a política cultural da cidade do Porto, chamando ao Presidente da Câmara (Rui Rio) um "energúmeno".
O jornalista foi condenado em primeira instância. O Tribunal da Relação absolveu-o num acórdão em que é relator o Desembargador António Gama (pode ver o resumo aqui entre o final da p. 91 e o princípio da p. 93, ou na íntegra seguindo as indicações dadas no texto).
A certa altura, diz o acórdão:
"É essencial, como referia Timothy Garton Ash, no The Guardian, que se retorne ao espírito de Voltaire: discordo do que dizes, mas defenderei até à morte o teu direito a dizê-lo".
(*) O Tribunal da Relação do Porto é um dos tribunais superiores que há mais tempo, e mais firmemente, adere à jurisprudência do TEDH. Portanto, este caso, mesmo que passe na 1ª instância, dificilmente passará na Relação.
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