À medida que o final do ano de 2016 se aproximava, eu sentia que todas as portas se tinham fechado e que, naquele momento, não havia nada que eu pudesse fazer. A Associação continuava com o estaleiro instalado no recinto da obra, mas o HSJ não iria desocupar o espaço. O Dossier Continente tinha sido boicotado. Não fazia sentido eu andar a angariar mecenas para uma obra parada.
Tudo estava em suspenso e a suspensão tinha custos. O consórcio Lucios-Somague absorvia os custos do estaleiro, ao abrigo da sua contribuição mecenática. Mas uma obra destas vive do momentum, da emoção e do entusiasmo que causa nas pessoas. O tempo mata-a se, entretanto, nada acontece. E nada acontecia da parte da Associação.
O ano de 2016 tinha sido definitivamente o pior ano dos três que eu levava à frente da Associação Joãozinho. Naquela altura, só me restava esperar. Saber esperar é uma virtude - mas não é certamente a minha maior virtude.
Quem falava agora acerca do Joãozinho era o Ministro da Saúde cada vez que vinha ao Porto e era inquirido pelos jornalistas. A mim, os jornalistas nem me procuravam. Era como se não existisse. Durante o ano, eu tinha perdido as três jornalistas que melhor conheciam o Joãozinho e que mais verdadeiramente reportavam sobre ele.
A Hermana Cruz do JN e a Joana Pulido da Lusa tinham mudado de secção, e eu próprio no Verão tinha cessado os meus comentários no Porto Canal, e agora só via a Fátima Ribeiro de Almeida esporadicamente. Muito influenciado pela Margarida Gomes do Público, ia-se gerando um clima de opinião segundo o qual a obra iria ser feita pelo Governo e a Associação Joãozinho não contava para nada.
As declarações do Ministro da Saúde sobre o Joãozinho causavam-me arrepios, sobretudo pela ingratidão que representavam em relação aos mecenas. Mas também pela ignorância e pelo desprezo que revelavam em relação ao trabalho da Associação. Nunca falou comigo para que eu lhe pudesse explicar em que consistia o Joãozinho. As suas declarações eram pura e simplesmente levianas.
Numa altura em que a minha secretária se batia para arranjar uma reunião com o Secretário de Estado Manuel Delgado - a qual nunca chegou a acontecer -, ele declarava no Porto que o Ministério iria receber a "Comissão", querendo com isso significar a Associação.
Por outro lado, a minha obsessão em fazer aquela obra era tal que um dia, a propósito de uma manchete sobre o Joãozinho, produzida por declarações do Ministro, eu fui o protagonista de um episódio caricato.
O Ministro tinha declarado que o Joãozinho era um problema para resolver e eu entendi que ele queria dizer com isso que o barracão metálico onde as crianças estavam internadas era um problema para resolver. E, triunfante, disse às minhas colegas da direcção: "E nós somos a solução!".
Elas foram ler as declarações do Ministro, e dias depois, chamaram-me à realidade. O que o Ministro queria dizer era que a Associação Joãozinho (que continuava com o estaleiro instalado no local da obra) era um problema para resolver. A solução era ele, que iria fazer a obra, a Associação Joãozinho sendo o obstáculo. Fiquei tão abatido quanto envergonhado.
Dias depois da obra ter sido interrompida em Março, eu escrevi um texto no blogue Portugal Contemporâneo para desabafar a minha frustração. Ainda hoje me orgulho do que escrevi - sintético, verdadeiro, directo ao ponto - e que terminava assim: "A minha próxima tarefa, que não estava prevista, é tirar o Governo do caminho". Agora, no final de 2016, nove meses depois, este sentimento era ainda mais forte.
Naquela altura eu já tinha tirado vários obstáculos do caminho. Antecipando um pouco da história, dentro de três meses, eu viria a tirar do caminho mais outro obstáculo - a jornalista Margarida Gomes do Público.
Quem agora verdadeiramente impedia o progresso da obra, tal como concebida pela Associação, era o Ministério da Saúde - uma ordem sua e o HSJ desimpediria imediatamente o espaço. Mas para confrontar o Ministério da Saúde, eu precisava de motivos.
Já tinha um, aquela palhaçada jurídica - para utilizar uma expressão que recentemente me tinha levado ao DIAP - que se traduziu no chumbo do Dossier Continente. Mas precisava de mais. Talvez o ano de 2017 me trouxesse mais mentiras vindas do Ministério da Saúde.
Seria então o momento de eu vir a público - já que os jornalistas não me ligavam nenhuma - e arrasar as mentiras do Ministério da Saúde acerca do Joãozinho. Eu acredito que a Verdade e o Bem acabam por triunfar.
Desde o momento em que abracei o Projecto Joãozinho que antecipei que iria envolver-me em alguns combates públicos, e quem se envolve em combates dá e leva - e ultimamente eu só tinha levado. De maneira nenhuma eu queria as minhas colegas da direcção expostas publicamente por causa do Joãozinho, e muito menos os mecenas.
Por isso, eu sempre me assumi, para o bem e para o mal, como a face pública do Joãozinho desde o momento em que ele passou a estar sob a tutela da Associação de que sou presidente. Em termos de comunicação pública, a política vigente na Associação Joãozinho foi sempre, desde o início, uma política inspirada no rei Louis XIV: "Petit Jean c'est moi!"
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