03 dezembro 2024

Almirante Gouveia e Melo (VII)

 (Continuação daqui)




VII. Responsabilidade e Justiça


Acima das forças de segurança, como a PSP e a GNR, está a mais decisiva e potente força ao dispôr do Estado, que são as Forças Armadas. 

As Forças Armadas têm como principal função defender a nação dos seus inimigos externos, mas esta não é a sua única função. Existe outra, muito menos falada.

Na primeira, quando um alto comando militar toma uma decisão, ele põe em risco vidas humanas, às vezes milhares de vidas humanas ao mesmo tempo, incluindo as dos seus próprios homens e mulheres. A responsabilidade associada às decisões dos altos comandos militares é extraordinária e é para assumirem essas responsabilidades extraordinárias que eles são treinados ao longo da carreira militar.

É esse elevado sentido de responsabilidade próprio de um militar de carreira que a figura do Almirante Gouveia e Melo virá inspirar e trazer à sociedade portuguesa.

É caso para perguntar se a sociedade portuguesa e, em particular, as instituições do Estado estão carecidas de responsabilização e da inspiração que o Almirante lhes virá trazer.

A resposta é afirmativa e, antes de dar um exemplo da mais radical irresponsabilidade no âmbito de uma das mais importantes instituições do Estado, é altura de dizer que, a seguir à Defesa Nacional, a mais importante função das Forças Armadas é a Justiça.

Nenhum criminoso vai de livre vontade para a prisão. Ora, no dia em que a PSP ou a GNR não conseguirem pôr na prisão um criminoso ou uma rede de criminosos serão as Forças Armadas que, ainda em defesa da nação, vão ser chamadas para o fazer. A Justiça é, em última instância, assegurada pela força e a força de última instância está nas mãos dos militares.

O Almirante Gouveia e Melo será uma referência para a Justiça em Portugal, o sector da vida pública portuguesa que, na minha opinião - e também na do povo português, segundo os inquéritos de opinião conhecidos - é o sector mais carecido de referências, de responsabilização, e de reformas também.

Agora, o exemplo da irresponsabilidade ao mais alto nível no sector da Justiça em Portugal, envolvendo o Conselho Superior da Magistratura (CSM), que é o órgão de governação dos juízes:

Um cidadão foi condenado por um tribunal de segunda instância do país por dois crimes de ofensas num acórdão em que dois juízes votaram a favor e uma colega votou contra. O cidadão recorreu para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que, numa decisão unânime de sete juízes, condenou o Estado português, sob o argumento que o cidadão não cometeu crime nenhum, apenas exerceu um vulgar direito democrático.

O cidadão protestou junto do CSM perguntando se havia alguma sanção, ainda que meramente disciplinar, para aqueles dois juízes que condenaram um inocente  e que viram dois crimes onde sete (sete!) juízes do TEDH não viram nenhum.

O CSM respondeu-lhe que não havia nada de errado com os Exmos. Senhores Desembargadores (sic), que se limitaram a exercer a sua independência e liberdade de julgamento (cf. aqui) (*). 

Para o CSM, condenar inocentes é parte da liberdade e da independência dos juízes. Quando a irresponsabilidade chega assim ao mais alto nível da judicatura, donde se esperaria o exemplo,  imagina-se o que se passa a níveis inferiores da vida pública portuguesa (**).

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(*) Fica-se a pensar como será no dia em que os polícias, invocando a sua liberdade de uso e porte de arma, começarem a disparar sobre quem passa na rua. 

(**) Eu abstenho-me de elaborar sobre o facto de, no último ano, certos agentes da justiça terem destruído um governo nacional de maioria absoluta e um outro regional, e ninguém ser responsável por isso.

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