A democracia pode tornar-se opressiva quando uma maioria usa o seu poder para esmagar os direitos das minorias e até cancelar as suas vozes. Tocqueville foi o primeiro a articular este conceito a que chamou ditadura da maioria ou tirania da maioria, na sua obra: “Democracia na América” (1835/1840).
John Locke e James Madison já tinham manifestado preocupação com os direitos das minorias e a “Bill of Rights” de 1789 (ano da Revolução Francesa) destinou-se precisamente a constituir um travão a impulsos tirânicos das maiorias democráticas.
Quando analisamos a história dos últimos quatro anos constatamos que Tocqueville foi profético e que nem sequer o sistema de travões e contrapesos da Constituição dos EUA (1788) foi suficiente para travar os governos democráticos na supressão dos direitos naturais das minorias.
A arquitectura política dos EUA permitiu que os partidos se aproveitassem de brechas legais (loopholes) para contornar a “Bill of Rights” e instituir, por essa via, uma clara e indesmentível tirania. As brechas são a guerra: guerra ao terrorismo, guerra ao SARS-CoV-2, guerra ao aquecimento global e até a guerra à desinformação. Ora, em estado de guerra, a Lei assume um estatuto secundário.
Na Europa passou-se exactamente o mesmo através da invocação do supremo interesse nacional e/ou do Bem Comum.
Penso que não são necessários exemplos concretos de abusos de Estado, porque estão à vista de todos. O seu volume é, em termos qualitativos e quantitativos, tão significativo que nos permite questionar se no Ocidente ainda restam vestígios da tão proclamada Democracia Liberal e Capitalista.
Analisando a composição política das ditaduras da maioria compreendemos que não reflectem a vontade de cada simples eleitor. São, por assim dizer, um produto agregado de múltiplas vontades, que encontrou um denominador comum.
A DITADURA DOS CONFORMISTAS (no título) é uma forma de tirania da maioria, mas diferente do conceito de Tocqueville.
O Estado utiliza as alavancas do poder para disseminar narrativas destinadas a formatar a opinião pública e a obter conformismo com as premissas propagadas, garantido depois o apoio eleitoral para as políticas de abuso dos direitos individuais das minorias.
Enquanto na ditadura da maioria do Tocqueville, os abusos de poder reflectem o máximo divisor comum de ideias diversas, no meu conceito de ditadura dos conformistas os abusos reflectem narrativas do Estado apoiadas por uma maioria submetida a lavagem cerebral.
Claro que o Estado é representado por pessoas e quando essas pessoas promovem narrativas que, em última instância, as vão beneficiar, a ditadura dos conformistas transforma-se na ditadura da oligarquia política e dos seus esbirros.
Enquanto a ditadura da maioria é uma pecha da democracia representativa, a ditadura dos conformistas é o regresso a uma espécie de feudalismo que exerce o seu poder sobre uma plebe de escravos agrilhoados mentalmente.
É neste contexto político que estamos a viver.
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