Dois dos vencedores das eleições legislativas do passado domingo foram o Chega e a Iniciativa Liberal.
Eu ressinto um pouco a sobranceria intelectual e social da IL em relação ao Chega, uma arrogância de intelectuais em relação ao povo que não augura nada de bom para a própria IL. Neste aspecto, a IL não difere em nada do BE que está agora a cair com estrondo, na minha opinião para nunca mais se levantar.
A atribuição de populismo ao Chega é mais uma manifestação de que a IL não é um partido português e que interprete as tradições portuguesas. Cotrim de Figueiredo disse recentemente que "As ideias são mais importantes do que as pessoas" (cf. aqui), e nesta frase resumiu tudo aquilo que pretendo dizer neste post.
Na tradição protestante (calvinista) que a IL interpreta chega-se a Deus somente pela Bíblia - o princípio protestante Sola Scriptura. Quem quiser chegar a Deus, deve estudar a Bíblia e discuti-la com os outros. A relação com Deus é uma relação intelectual e é pelo intelecto que se chega lá. Não surpreende que praticamente todos os filósofos modernos - à excepção mesmo do fundador da filosofia moderna, Descartes, que era católico - têm origem nos países tocados pelo protestantismo - Locke, Hume, Adam Smith, Kant Hegel, Marx, etc.
Não é assim na tradição católica portuguesa. Nesta tradição chega-se a Deus pela Bíblia, sim, mas também pela Tradição. A Tradição é constituída pelos bens civilizacionais de origem cristã, desenvolvidos ao longo dos séculos, e que foram passados de geração em geração. Esses bens incluem valores - como os da vida, da paz, do amor, da liberdade etc.,-, mas também comportamentos - como a maneira de falar e cumprimentar os outros - e coisas concretas - como o pastel de nata ou as tripas à moda do Porto.
Na tradição católica chega-se a Deus também pela Tradição. E quem transporta a Tradição são as pessoas, são elas que ao longo dos séculos filtraram o bem do mal, separaram aquilo que é bom daquilo que não presta, e passaram esse acervo de bens da sua geração para a geração seguinte.
Quem transporta a Tradição são as pessoas, mas não quaisquer pessoas. Certamente que não os intelectuais que são os primeiros a contestar a Tradição, e foi precisamente isso que deu lugar ao protestantismo.
A Tradição está no povo, é o povo que transporta consigo as grande tradições portuguesas - como a liberdade, o amor ao próximo, a paz - e também aquelas outras mais comezinhas, como o cozido à portuguesa ou a carne de porco à alentejana.
Está estabelecida a conclusão a que pretendia chegar. A IL é um partido de intelectuais alheio às tradições portuguesas, que olha com arrogância para elas e para o próprio povo português. O Chega é ao contrário. O Chega dirige-se ao povo português porque é o povo português que transporta as tradições portuguesas, e não apenas as do bolo rei ou do pastel de nata, mas aquelas que mais significado tem para a Iniciativa Liberal, que é a tradição de liberdade.
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