23 maio 2021

Auto-responsabilidade (2)

 (Continuação daqui)


2. A cultura da auto-vitimização

É o princípio da auto-vitimização que está na base do socialismo - "os pobres são pobres por culpa dos ricos". É também este princípio que está na base de certas correntes da teologia católica tradicional - segundo as quais Deus tem uma opção preferencial pelos pobres - e de outras mais modernas, como a teologia da libertação.

"Coitados dos pobres. Eles são as vítimas!", é a mensagem que emerge quer do socialismo quer dessas correntes da teologia católica. Nunca ocorre aos seus autores perguntar aos pobres o que é que eles fizeram para se libertar da pobreza, ou o que é que não fizeram - v.g., estudar - para evitar cair nela.

Mas antes que eu caia no erro de atribuir aos pobres o exclusivo da cultura da auto-vitimização, gostaria de afirmar que o exemplo vem de cima e encontra a sua maior expressão nos intelectuais dos países de cultura católica. O falecido Vasco Pulido Valente era o exemplo acabado do cultor da auto-vitimização.  Tudo à volta dele era mau - excepto ele próprio. 

E António Barreto, para citar um vivo e dos mais conhecidos, vai pelo mesmo caminho. Tudo à volta dele é mau - excepto ele próprio. Como é que o primeiro poderia ser um génio da História e o segundo um génio da Sociologia, se tudo à volta deles era mau? Não podiam.  

A culpa é do país em que nasceram no qual, aos olhos deles, tudo é mau - excepto eles próprios. Ora, quem é que consegue ser bom rodeado de maus por todos os lados? Ninguém consegue ou, pelo menos, é muito difícil.

O socialismo foi introduzido em Portugal por uma geração de intelectuais - a chamada geração de 70 - como Eça de Queiroz, Oliveira Martins, Ramalho Ortigão e outros. Quem ler os seus livros - a começar pelo Portugal Contemporâneo de Oliveira Martins, que dá o nome a este blogue - vai dar-se conta de que tudo à volta deles era mau - excepto eles próprios.

A questão a que pretendo agora responder é a seguinte. Se tudo à volta deles era mau, se eles não foram mais longe na vida [eles próprios se intitulavam mais tarde "os vencidos da vida"] pelo facto de o país em que nasceram ser mau - e não ser fácil para ninguém ser bom quando está rodeado de tudo quanto é mau - como é que estes cultores da auto-vitimização vão acabar?

Vão acabar a viver à custa do Estado. Se foi o país que os vitimizou, então o país que os indemnize e os sustente. E foi assim que acabaram todos os intelectuais da geração de 70 - socialistas e a viver à custa do Estado (com a possível excepção de Antero) (*). E é assim que, desde então, têm vivido em Portugal sucessivas gerações de intelectuais -  socialistas e  a viverem à custa do Estado.

Num país onde prevalece a cultura da auto-vitimização não são apenas os pobres que acabam a viver à custa do Estado e subsídio-dependentes. Os intelectuais e os artistas também. E são estes que espalham a cultura.

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(*) A excepção de Antero é matéria para reflexão. Talvez num momento de lucidez tenha compreendido que aquilo que existia à volta dele não era nada mau e que o pior de tudo talvez fosse ele. Poderá ter sido por esta conclusão que se suicidou.

(Continua)  

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