III. Os milhões
A analogia entre a construção pelo Governo da ala pediátrica do HSJ e a compra pelo Governo de 500 ventiladores à China é multifacetada, como já referi anteriormente.
E uma das faces da analogia é precisamente o jornal Público.
Foi o Público, pela mão da jornalista São José Almeida, que primeiro noticiou a compra heroica pelo Governo de 500 ventiladores à China pelo preço de dez milhões de dólares, embora hoje, três semanas volvidas, não se saiba ao certo onde é que param os ventiladores e muito menos os dez milhões.
A notícia do Público do mês passado era bombástica: "Ventiladores salvos através do BNU de Macau" (cf. aqui).
Também foi o Público, mas pela mão da jornalista Margarida Gomes, que - numa altura em que o Governo bloqueava a obra da Associação Joãozinho há perto de um ano - primeiro noticiou que seria o Governo, ele mesmo, a construir a ala pediátrica do HSJ por 21 milhões de euros, embora hoje, mais de três anos volvidos, não se saiba onde pára a ala pediátrica do HSJ e muito menos os 21 milhões.
A notícia do Público de Janeiro de 2017 era igualmente bombástica: "Governo liberta 21 milhões de euros para tirar crianças dos contentores no S. João" (cf. aqui).
Em ambos os casos há milhões envolvidos, mas a analogia tem de ser interrompida aqui porque, num caso, são milhões de euros e no outro milhões de dólares. E também porque, num caso, os milhões são "libertados" e no outro os milhões são "transferidos".
Na realidade, no âmbito da analogia, esta é talvez a diferença mais importante - a diferença entre milhões "libertados" e milhões "transferidos".
No caso da ala pediátrica do HSJ, fica-se com a ideia de que foi um funcionário das Finanças - talvez um secretário de Estado - que assomou a uma das janelas do Terreiro do Paço e "libertou" os 21 milhões de euros ao vento, os quais - quais pombos-correio -, eram supostos chegar direitinhos dias depois à Estrada Interior da Circunvalação no Porto, onde está situado o Hospital de São João.
No outro caso, tudo foi mais sofisticado. Foi uma equipa especial de governantes - julga-se que três secretários de Estado -, que comandou a transferência dos 10 milhões de dólares para a China, envolvendo gestores da Caixa Geral de Depósitos, funcionários do Instituto de Gestão do Crédito Público, o embaixador português em Pequim e ainda um administrador do BNU-Macau que estava insolentemente a dormir (cf. aqui), enquanto os governantes e burocratas portugueses, a partir de Lisboa, lutavam heroicamente e de pé pelos ventiladores até altas horas da madrugada.
Porém, estas pequenas nuances não devem afastar ninguém da analogia essencial. Mais de três anos depois de a Margarida Gomes ter noticiado no Público que o Governo tinha libertado 21 milhões de euros para fazer a ala pediátrica do HSJ, não se sabe onde param nem a ala pediátrica nem os milhões.
Da mesma forma que, três semanas depois de a São José Almeida ter reportado no Público que o Governo tinha transferido 10 milhões de dólares para a China para comprar 500 ventiladores, não se sabe ao certo onde param os ventiladores e muito menos os milhões.
(Continua aqui)
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