23 fevereiro 2020

A manipulação da justiça (III)

(Continuação daqui)


O desenho anterior diz tudo, mas o seu autor não sou eu. Por isso, convém que eu formule explicitamente a questão e lhe dê resposta.

-Estou eu convencido que a distribuição do processo relativo ao meu case-study (cf. aqui) no Tribunal da Relação do Porto também foi cozinhada?

-Absolutamente.

Existem vários indícios todos convergindo nessa conclusão e o principal é científico e assente na Teoria das Probabilidades.

Um Tribunal superior está dividido em várias secções. Em geral, um processo é distribuído a uma secção e daí é distribuído a dois juízes dessa secção, um chamado juiz-relator e outro chamado juiz-adjunto.

Se os dois juízes estão de acordo acerca da sentença, o juiz-relator redige o acórdão e o juiz-adjunto assina por baixo. Pelo contrário, se há desacordo entre os dois, é chamado o juiz presidente da secção que desempata e a  decisão é por maioria.

O Tribunal da Relação do Porto tem duas secções criminais, cada uma com 19 juízes, incluindo o presidente (cf. aqui). O meu processo foi distribuído à primeira secção e daí foi distribuído aos juízes Paula Guerreiro (relatora) e Pedro Vaz Pato (adjunto).

Os dois juízes não se entenderam, a juiz Paula Guerreiro queria absolver-me, o juiz Vaz Pato queria condenar-me. Foi chamado a desempatar o presidente da secção que votou com o juiz Vaz Pato. O juiz Vaz Pato acabou por tornar-se o relator do acórdão e a juiz Paula Guerreiro fez uma declaração de voto de vencida (cf. aqui).

Neste ponto, e à margem do assunto, devo agora lembrar os leitores do PC que eu tenho medo de pronunciar o nome do juiz que preside à primeira secção criminal do TRP. Já expliquei por quê (cf. aqui). A explicação está também na figura em baixo na parafernália que ele traz à cintura.

Agora, a pergunta: Se a distribuição do meu processo tivesse sido aleatória, qual a probabilidade de ele ter ido parar às mãos do presidente da primeira secção e, a partir daí, aos juízes Paula Guerreiro e Vaz Pato?

A resposta é 1/612 (um a dividir por 612), ou seja 0.0016, quer dizer 0.16%, a sexta parte de um por cento (*).

É caso para dizer - como refere o Francisco Teixeira da Mota (cf. aqui) - que o Paulo Rangel teve sorte, eu diria mesmo muita sorte. Um acontecimento com uma probabilidade tão pequena de ocorrer saiu-lhe mesmo. É como se lhe tivesse saído o jackpot no casino.

A combinação ganhadora era 1 05 06 em que o primeiro dígito se refere à secção e os dois pares de dígitos seguintes se referem à ordem por que os juízes Paula Guerreiro e Vaz Patto aparecem na lista desta secção (são quinto e sexto, respectivamente, cf. aqui).

Esta combinação ocorre uma vez em cada 612 vezes que se puxar a manivela. Mas ao Rangel saiu-lhe logo à primeira.

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(*) Chega-se a este número multiplicando a probabilidade de o processo ir parar à primeira secção criminal (1/2) pelas probabilidades de, em seguida, serem escolhidos a juiz Paula Guerreiro (1/18) e o juiz Vaz Pato (1/17).


(Continua)

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