No tempo do Estado Novo o Ministério Público não tinha o protagonismo mediático que hoje possui nem andava por aí a criminalizar pessoas ao desbarato ou a prendê-las preventivamente - pessoas que, num número crescente de casos, vem depois a provar-se em tribunal que estavam inocentes.
A que é que se deve esta alteração, o que era o Ministério Público então e o que é ele hoje?
Uma excelente explicação sucinta está aqui.
De meros funcionários públicos passaram a "magistrados" usurpando uma designação até aí reservada aos juízes, e criando uma carreira paralela à dos verdadeiros juízes (que é aquilo que, no fundo, eles gostariam de ser).
Da tutela do ministro da Justiça, passaram a gozar de autonomia e poder judicial próprio, que partilham com os verdadeiros juízes.
Mas se o poder judicial pertence tradicional e exclusivamente aos juízes, que são os verdadeiros magistrados, que território de poder vão ocupar estes novos "magistrados de segunda apanha"?
Para responder, talvez seja útil lembrar a imagem da justiça como uma balança composta pelos dois pratos e o fiel que os equilibra. O lugar dos verdadeiros juízes é o do fiel da balança, que pondera o peso dos dois pratos - a acusação e a defesa - e decide em conformidade, isto é, julga.
Mas, estando este lugar de fiel da balança ocupado pelos verdadeiros magistrados, em que lugar se vão especializar os novos "magistrados"?
Na acusação. Tornam-se acusadores profissionais e "julgam" sobre as suas próprias acusações, competindo esta função ao "juiz"-de-instrução (outra designação usurpada aos verdadeiros juízes), e que não é mais do que um "magistrado" no topo da carreira, a quem é reconhecido o poder para aplicar penas (as chamadas "medidas de coacção"), como se de um verdadeiro juiz se tratasse.
O seu local de trabalho é o Tribunal de Instrução Criminal que, em consequência, e só por brincadeira se pode chamar Tribunal.
É que a acusação, só por si - a consideração exclusiva de um dos pratos da balança -, não é justiça nenhuma, da mesma maneira que a defesa, só por si - a consideração exclusiva do outro prato da balança - também não é.
Pelo contrário, um órgão do Estado que se especializa só na acusação contém o potencial para cometer graves injustiças - o de acusar pessoas inocentes. Da mesma maneira que um órgão que se especializasse só na defesa teria o mesmo potencial - mas agora o de inocentar criminosos. Por isso, só por brincadeira também se pode chamar ao Ministério Público um órgão do nosso sistema de Justiça.
A verdadeira Justiça exige a ponderação simultânea dos dois pratos da balança, e essa só os verdadeiros juízes a podem fazer. Só eles são o fiel da balança. Só eles são verdadeiro poder judicial. O Ministério Público é apenas uma burocracia do Estado que usurpou poder judicial enquanto a democracia em Portugal ainda andava a dormir.
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