03 março 2016

S. Joaquim

Não conheço o Henrique Raposo, nem li o seu livro, mas parece que está  a ser objecto de uma hate campaign.

Se havia hate campaigns por essa Europa fora, nós também as tínhamos de ter. Parece que chegaram agora e eu penso saber a razão.

Tenho alguma experiência disso.

Como reagir?

Não reagir. E, se possível, ter um santo por perto.

Chegaram a dizer-me que nunca tinham visto um pessoa ser tão insultada nas redes sociais, e perguntaram-me como é que eu reagia. Eu encolhi os ombros. Quanto às redes sociais, nem sequer as frequento, pelo que as ameaças de agressão que existiam por lá, e também, parece, algumas de morte, só me chegaram tardiamente e por via indirecta.

E eu não tinha medo que me riscassem o carro, me pintassem os muros da casa, me agredissem na rua ou me pusessem processos judiciais?

Não. Continuei a fazer a  minha vida normal. Eu nem sequer tenho medo de morrer. (Há dois anos, quando a minha filha mais nova se tornou independente, eu conquistei uma liberdade que nem sequer sabia existir, eu que já fui considerado um grande liberal - a liberdade de morrer).

Nenhuma pessoa alguma vez se dirigiu a mim directamente na rua, por carta, telefone ou e-mail para me criticar pelo que eu havia dito - refiro-me, é claro, às Shrill Girls. As únicas pessoas que o fizeram foi para me dizer que  pensavam o mesmo que  eu,  só que não tinham coragem ou possibilidade de o dizer.

Aquilo é só conversa. E conversa fiada.

Houve só um momento, tenho de confessar, em que estive prestes a deitar a toalha ao tapete. Foi no dia em que um jornal publicou uma entrevista minha, nas duas páginas centrais, sem sequer falar comigo, e com citações minhas na primeira página.

Quando cheguei a casa, a minha mulher estava zangada comigo:  "Que eu não tinha necessidade de me andar a expor àquilo... tal, tal, tal...", tanto mais que ela também era mencionada (tipo: A Dona L. é uma mulher muito especial para estar casada com um tipo destes). Escusado será dizer que o entrevistador conhecia tanto a Dona L. como me conhecia a mim.

Lá respondi, cabisbaixo, porque a Dona L. tinha razão: "Tu sabe o marido que tens...".

Mas a coisa estava complicada. Foi o Joaquim que me salvou. No dia seguinte telefonou-me para gracejar sobre as reacções. E eu aproveitei para lhe pedir: "Oh Dr. Sá Couto, dê uma chamada à L. porque ela está a tomar isto muito a sério..."

E o Joaquim fez o milagre.

4 comentários:

zazie disse...

Há uma coisa que ainda não consegui perceber nesta anormalidade com o Raposo.

Houve mesmo gente ao vivo a impedir alguma coisa ou toda esta palhaçada é virtual?

É que tenda montada no facebook e o mesmo nome na blogo, não dá. Só se monta a tenda para quem se vende. E quem trata da venda é o intermediário.

Anónimo disse...

Ainda ontem no "Você na TV" da TVI estavam um chefe da GNR alentejano e um inspector da PJ que contaram estórias horríveis sobre coisas que se passaram no Alentejo, devido à miséria que sempre imperou naquela (pobre) região. Mas o Henrique Raposo não pode escrever um livro a criticar coisas que se passaram no Alentejo, apesar de ser descendente de alentejanos.

Se o Raposo fosse de esquerda, apresentavam-no como um caso de sucesso do regime, como um filho de alentejanos que migraram para Lisboa, que conseguiu tirar um curso universitário e misturar-se com a "fina flor" da capital. Mas como o autor (por quem de resto nem tenho simpatia alguma, por ser um lampião ordinário) é de direita, caiu-lhe tudo em cima.

Isto diz muito de como a esquerda é intolerante e hipócrita. Esta polémica ainda por cima é fomentada por gente que se calhar nem lê livros. De qualquer modo, não tenciono comprar esse livro. Em primeiro lugar porque não quero saber de estórias sobre o Alentejo, e em segundo porque isto tudo é uma vergonha. E não se compreende como a Fundação financiou aquele livro, que de investigação não tem nada. Cheira tudo a amiguismo, de um lado e de outro.

Anónimo disse...

Não esqueçam que desde D. Dinis até D. João II, o Alentejo foi onde o poder real residiu. No Alentejo há tantos pobres como no resto do país. Não são é burros. Aprenderam a viver com economia e com qualidade. E "espremem" os outros sempre que podem, fazendo-se de parvos.
Após 1640, España tentou invadir Portugal sempre pelo Alentejo. Já tinham tido más experiências ao tentar entrar mais a norte. Nos dois primeiros dias parecia que iam ganhar, mas a nossa tropa (com muitos alentejanos) arrumava-os em mais dois dias.
Abraço

Rui Alves disse...

A sua narrativa pessoal expõe mais uma vantagem do celibato sacerdotal. Um padre pode fazer frente ao poder político ou às correntes dominantes sem perigo de expôr ou desfalcar família (se algo lhe suceder). Nesses desafios, a família é inevitavelmente um elo mais fraco e um meio de pressão ao qual o padre está imune.

Já por diversas vezes referiu ter alcançado finalmente a liberdade de morrer. No seu caso, na qualidade de marido e pai, de quantos anos precisou? A mim, faltam pelo menos duas décadas. Mas já lhe ocorreu que um padre tem essa liberdade desde sempre. Mais do que isso, por vezes não só tem essa liberdade, como sente ter a morte por obrigação.