01 agosto 2015

os polícias da saúde

Actualmente, por mês, são aviadas cerca de sete milhões de receitas médicas em Portugal, mas sabe-se que uma parte significativa, "15%", não são levantadas por várias razões, por exemplo, porque o cidadão não tem dinheiro ou porque não segue a posologia recomendada. Quando o novo sistema estiver completamente operacional, os médicos passam a poder perceber se os seus pacientes compraram ou não os medicamentos receitados, diz. “Uma das grandes vantagens para o médico é a de perceber se o doente comprou ou não os medicamentos", enfatiza.
Público

Comentário: Os sistemas de saúde devem estar focados nas vantagens que oferecem aos doentes e não nas vantagens que oferecem aos médicos (como se afirma no texto). Os médicos não são controleiros, nem polícias. Dão conselhos, mas não obrigam os doentes a cumpri-los.
Compreendo que a indústria esteja preocupada com esta perda de 15%, mas não pode esperar que os médicos façam o papel de polícias da saúde. Perderiam toda a confiança dos doentes.
Quando descubro que um doente não está a seguir as minhas recomendações mostro-me sempre tolerante e costumo até contar esta historieta:
- Sabe, há muitos anos um professor de medicina disse-me o seguinte: ‹‹Joaquim, se todos os doentes seguissem as minhas recomendações eu não tinha doentes››.

17 comentários:

sampy disse...

Parece-me evidente que o "argumento" foi a forma encontrada de tentar vender esta nova acção controleira à opinião pública. Ou melhor, de começar já a contrariar, diante da opinião pública, a resistência mais que certa dos médicos: "pois que o sistema traz grandes vantagens para eles"...

sampy disse...

Eu compreendo a necessidade imperiosa de o Estado encontrar métodos mais eficientes de controlo das receitas médicas. As fraudes têm sido monstruosas no sector; e, aparentemente, até com esquemas de pouca complexidade, bastando jogar, por exemplo, com os medicamentos que são receitados e não são comprados.

O problema são as consequências imprevistas desse controlo, e os aproveitamentos que dele podem surgir.

No meu caso concreto, o chip não está no cartão de cidadão, mas no cartão da seguradora. É ela que controla a receita e os medicamentos comprados. Tal é justificado pela comparticipação que a seguradora é chamada a cobrir. Mas isso significa também poder controlar o risco e, logo, o valor da apólice. Quem não quiser ser (demasiado) controlado, tem sempre a possibilidade de os pagar do seu bolso (se não tiver amor ao dinheiro); ou, então, de atravessar a fronteira para ir comprar alguns medicamentos aonde esse controlo não chega (mas aí, corre o risco na alfândega...).

sampy disse...

A parte do livrar-se da papelada também é um bom argumento; mas relativo. Tem funcionado bastante bem nas Finanças (a entrega do IRS é disso exemplo); mas já na Justiça, a coisa tem sido uma loucura...

sampy disse...

E repescando o "argumento" atirado à parede - "os médicos saberão se os medicamentos foram comprados": não interessará também aos médicos saber se os medicamentos foram tomados? E como foram tomados?

Que é que estará então a ser pensado para oferecer aos médicos mais essa grande vantagem? Exigência de prova vídeo ou fotográfica? Depoimento digital dos encarregados de educação ou outras testemunhas? Toma do medicamento na farmácia, com comparência de 8 em 8 horas, e consequente validação inserida no chip?

sampy disse...

Uma possibilidade interessante que vejo no novo sistema: sabendo-se que já temos algumas farmácias robotizadas, seria questão de criar uma caixa dispensadora (estilo multibanco) acessível do exterior da rua.
Era pagar e andar, a qualquer hora do dia ou da noite.
O posto de farmacêutico é que ficaria algo comprometido...

sampy disse...

Ora bolas: devia ter lido melhor a notícia.

Afinal, o chip do CC é só para a assinatura electrónica do médico. O chip do CC do paciente não chega a ser utilizado, como, erradamente, eu estava a supor.

JoaoMiranda disse...

Receita electrónica serve essencialmente para controlar a fraude em medicamentos comparticipados.

Anónimo disse...

Há lá maior fraude do que o estado? Basta ver as PPP! Que tal controlarem com uma coleira eletronica os paasos dos ministros?

Unknown disse...

Para mim, há nestas medidas uma característica que me deprime: é feita na optica que o cidadão precisa de um tutor.
Claro que se formos simples e seguirmos o conselho, que dá muitas vezes respostas certas- segue o dinheiro, fico ainda mais irritado.
Então eu sou obrigado a ir a um medico pre definido para meu "bem"? estão a gozar com a minha cara, ou acham que eu sou mais tolo do que já pareço?
Fazem-nos pagar uma consulta para renovar receitas de remédios crónicos e julgam que somos tolos?
Estas e outra pérolas de protecção aos instalados devia ser reflectido pelos "utentes", digo escravos.

Anónimo disse...

O conselho do Prof. de Medicina ao Dr. Joaquim Couto é um dos poucos bons resumos da actividade de um médico.
Sei que as pessoas não tomam os remédios à risca, falhando muitas doses: para bem delas, evitam toxicidades.
Perigosas são as pessoas que tomam tudo à risca. Sobretudo quando somam receitas de vários médicos.
A função do médico é aconselhar; nunca foi impor, nem vigiar.
Abraço

Josand disse...

Extrapolando resultados doutros estudos, sabendo que existe uma elevada percentagem de erros na prescrição de medicamentos, a não toma reduz a iatrogenia o que significa que não tomar os medicamentos é muitas vezes mais saudávrl que tomá-los.

Um dia far-se-á justiça e perceber-se-á a enorme nódoa que este Paulo Macedo e o seu verdadeiro Ministro, o Leal da Costa(secretário de Estado), fizeram e propiciaram em Portugal.

Não percebo a boa imprensa deles, sinceramente não percebo

Luís Lavoura disse...

O médico faz sempre o papel de polícia, pode é ser um polícia severo ou leniente. Por exemplo, o Joaquim é um polícia leniente - não castiga os seus doentes quando descobre que eles estão em falta.

Anónimo disse...

Quando um médico prescreve, na mesma receita com 3 vias (e portanto com o mesmo prazo de validade), em número igual de embalagens (i) um medicamento do qual se toma 1 unidade 3 vezes por dia (posologia prescrita pelo próprio médico) e que é disponibilizado numa embalagem comercial de 30 unidades (oferta comercial constante na base de dados que o médico utiliza para prescrever) - 1 embalagem dá para 10 dias, e (ii) outro do qual se toma ½ comprimido por dia e que é disponibilizado numa embalagem comercial de 60 unidades – 1 embalagem dá para 120 dias, é natural que, dessa receita, não sejam compradas todas as embalagens do 2.º medicamento, a menos que o doente esteja disponível para comprar para stock.

Estamos ao nível da aritmética da antiga 4a. Classe, com contas que se fazem de cabeça. Não é ciência espacial.

AS

Anónimo disse...

Vai-se a ver e o único mérito desta medida é o de evidenciar (a) o verdadeiro inferno por que passam, ao nível da obtenção de receituário, os portadores de doença crónica, e (b) a falta de eficiência e de sentido de serviço ao doente nalguns destes actos médicos (prescrição de receituário) que constituem o corolário de uma consulta médica (e que alguns médicos especialistas – a profissão médica vive em regime de castas – tentam “chutar” para os centros de saúde, como se os seus colegas de Medicina Familiar fossem seus assistentes administrativos).

Uma administração pública caríssima que ainda nem sequer conseguiu perceber o enorme desperdício de tempo de médico e de doente (às vezes doentes com mobilidade reduzida que gastam fortunas em táxi nas deslocações aos centros de saúde – 2 deslocações por receita, uma para pedir outra para levantar) que constitui a repetição, ao longo do ano, da prescrição de medicamentos para doentes crónicos. E mais uma notícia que insinua a culpa do cliente. Que tristeza! Uma só receita anual – com o número de embalagens adequado à posologia e ao número de unidades de cada embalagem comercial - para os doentes crónicos seria talvez eficiente demais?

AS

Josand disse...

Todos os métodos de avaliação de adesão à terapêutica comprovaram não serem suficientemente fidedignos...a não ser que se planeie instalar um big brother em casa.

Comprar os medicamentos não significa que se vá tomá-los.
E tomá-los não significa que se vá ficar bom
Ser médico também não significa que se saiba receitar
Ora é um factor de sanidade não comprar medicamentos a médicos (que nem se podem escolher) que se julga não saberem receitar.

Se querem obrigar os doentes a tomar medicamentos de médicos em que não confiam, preparem-se para efeitos Nocebo...

Josand disse...

"Para que o sistema funcione (e as farmácias já estão quase todas equipadas), é preciso ainda distribuir leitores de cartões de cidadão pelos hospitais e pelos centros de saúde do país, de forma a que os médicos possam utilizar a assinatura electrónica"

Que empresa vende os leitores de cartões?

Josand disse...

Trials and errors

The evidence base for new medicines is flawed. Time to fix it

http://www.economist.com/news/leaders/21659743-evidence-base-new-medicines-flawed-time-fix-it-trials-and-errors