O norte era de facto outro país. Perante um sul de funcionários públicos e de latifúndios e grandes empresas — propriedades de velhas famílias protegidas pela ditadura, e depois nacionalizadas pela revolução –, estava este outro país de pequenos agricultores, pequenos empresários e emigrantes, na maior parte self-made men, ciosos das suas propriedades, ligados desde a década de 60 à Europa ocidental pelas exportações e pela migração, e unidos em comunidades ferozmente independentes, à volta das suas autoridades religiosas tradicionais. E curiosamente, era também a norte que estava a maioria da “classe operária”, não em grandes unidades industriais, mas em pequenas fábricas espalhadas pelos campos. Foi esse povo que, no Verão de 1975, saiu em massa à rua, ao toque de sinos, para contestar o comunismo fardado de Lisboa. Em pouco tempo, as sedes do PCP e da extrema-esquerda conheciam, a norte, o destino que, a sul, tinham tido as dos partidos não-socialistas.
Rui Ramos, no Observador
Comentário: Um excelente artigo sobre "a resistência do Norte", um tema a que me referi aqui
2 comentários:
Atenção, no Sul o litoral e barrocal algarvios eram um mundo diferente, com semelhanças com o Norte do país. Pequena propriedade, muitas empresas de pequena dimensão, ligadas ao turismo, agricultura e pescas, cidadas com tradição histórica de independência e com muita individualidade... Quando se fala no Sul deve-se recordar o caso particular do litoral algarvio.
Na Madeira foi igual.
O PSD alcançou desde logo uma vitória incontestável nas primeiras eleições, e tudo porque era considerado pelo povo como o partido mais fiel à igreja e à tradição.
Nas zonas rurais os carros dos "doutrinadores" comunas eram corridos à pedrada e à bastonada, e não raras vezes a população se insurgiu para proteger pessoas eminentes da sua terra (por exemplo, o caso do Dr. Castro Jorge em Câmara de Lobos).
Mas o melhor exemplo da resistência organizada madeirense foi a FLAMA, que bomba após bomba, foi "convidando" a cambada revolucionária a regressar à toca e a devolver a ilha aos legítimos madeirenses.
Na minha infância ainda se viam slogans e bandeiras da FLAMA pintados nas paredes. E a verdade é que hoje as cores da FLAMA sobrevivem na bandeira oficial da Madeira. Mera coincidência?
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