14 outubro 2013

devagar que tenho pressa


A minha querida amiga H. perguntou-me ontem, numa reunião familiar, porque é que eu acho que os incentivos financeiros não aceleram o trabalho dos cirurgiões. A H., que é uma leitora assídua do PC, tinha lido este post e esta minha resposta e ainda esta breve do PA.
-       Ó Joaquim, já são 4 a 1.
-       Pois é, mas a verdade nem sempre está nos “números”.
Sorri e perguntei-lhe:
-       H., já algum dia viste uma cirurgia? – Nem pensar, não posso ver sangue...
-       A maior parte das pessoas não tem qualquer ideia do que é um acto cirúrgico, contudo não se coíbe de dar uns palpites. Falar de cirurgia a um leigo é como tentar explicar a sensação de andar numa Harley-Davidson. Quem já andou não precisa de explicações e quem nunca andou não atinge...
-       Deixa-te de tretas, vocês querem é acelerar na facturação...
-       Vou-te dar um exemplo. É difícil encontrar actividades parecidas com a cirurgia, mas talvez com um exemplo a gente chegue lá. Imagina que uma operação é como fazer um bolo. Partes duma receita, adquires todos os materiais necessários e depois toca a cozinhar. Tanto faz remunerar o cozinheiro com salário como à peça, não é possível acelerar a confecção do bolo. Quando muito, ao acelerar estragas o bolo e vai-te lucro que me dás perda – O exemplo pareceu-lhe um pouco grosseiro...
-       Ó Joaquim...
-       Diz lá... queres que te faça um bolo de chocolate ou preferes que te opere? Como não me vais pagar, não corres perigo.
-       Não brinques – comentou a H. – então porque é que no adicional se operam mais doentes/ unidade de tempo do que na rotina?
Gostei da candura da H., ela confia no PA e o PA confia no Álvaro Almeida, onde está o gato?
-       O problema, minha querida, é que no adicional, e voltando ao exemplo que te dei, abrem duas ou três cozinhas em simultâneo e o cozinheiro, mal acaba um bolo, passa imediatamente para a segunda cozinha onde tudo já está pronto para confeccionar o segundo. Assim, num dia, é possível fazer muito mais bolos sem que diminua o tempo que demora a fazer cada um.
-       É pá, e porque é que não fazem o mesmo na rotina?
A H. tem mesmo piada.
-       Achas que isso depende dos médicos?
-       Pois... então porque é que o Público afirma de forma tão inequívoca que os médicos operam mais depressa quando recebem incentivos financeiros?
-       H., eu no Público já quase só leio o MEC e o VPV... tu devias começar a fazer o mesmo. Mas não fujas com o rabo à seringa, não gostavas que eu te operasse? Olha que eu para além de cirurgião já fui professor de anatomia...
-       Ahahah acho que vou primeiro experimentar uma voltinha de Harley-Davidson.

15 comentários:

Carlos disse...

Onde está o gato, pergunta o Joaquim. Talvez nesta, aparentemente, inocente pergunta: "Achas que isso depende dos médicos?"

A gestão hospitalar tem muito que se lhe diga, e muito se tem dito, mas pura e simplesmente insinuar que não tem NADA a ver com os médicos, parece-me, pelo menos, a sombra do rabo do gatinho escondido.

zazie disse...

Uma cirurgia é isto, ó doutor:

http://www.youtube.com/watch?v=evlrs5Bi_6E

Ricciardi disse...

Portanto, o Min. da Saúde deve aumentar o Investimento e criar mais salinhas de operações paralelas de forma a que o pasteleiro repita o procedimento sem maiores perdas de tempo.
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Olhe, na agricultura eu tambem já pensei nisso. Porque não plantar os tomatinhos numa passadeira rolante e um gajo ficar ali com a enchada na mão a tirar as ervas daninhas à medida que aquilo rola?
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Em tempos estudei esses métodos para uma fabrica. Um gajo repetir a mesma cena, qual automato, e o mundo girar à nossa volta. Dá quase sempre barraca e acabei por achar que as linhas de montagens devem ser separadas.
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Quando um tasco está pronto a meter a faca, a operação do tasco anterior complica-se e lá tem de ficar o bolo a fermentar mais do que a conta.
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A não ser que operem com aqueles aparelhos auditivos que usam os arbitros de futebol. Quando a operação está a correr bem o cirurgião comunica com a sala do lado e diz para começarem a anestesia que ele já está quase quase a sair.
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Eu até me imagino como gestor de um hospital a fazer o controlo remoto de tempos de cirurgia:
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- Dr. Joachim a sala do lado está à sua espera.
- Ok, já vou.
- Dr. Joachim já anestesiamos o doente.
- Ok, está quase pronta a operação da sala nº1.
- Dr. Joachim corra sff para a sala do lado senão o gajo acorda da anestesia e ainda lhe dá uma coisinha má.
- Epá Rb não me foda caralho ainda não acabei de suturar este gajo da nº1.
- Dr. Joachim deixe esse aberto, lava as mãos e corra para a sala do lado.
- Ok, cheguei à sala 2 Rb, precisamos de mais uma anestesia sra. enfermeira que o tipo está a bocejar.
- Dr. Joachim o sala 3 iniciou processo de remoção do apendice.
- Ok.
- Dr. Joachim, o doente da outra sala está a acordar e ainda não foi suturado. Corra para lá.
- Rb, corro para onde?
- Para a sala nº1 do cliente não suturado.
- Então e este da sala nº3?
- Ainda dorme, vá a correr à nº1 e depois passe pela nº2 e inicie o processo de corte abdominal.
- Ok.
- Dr- Joachim, o doente da sala nº 3 tem a tensão arterial a descer, corra para lá e prepare-se para a operação ao figado da sala nº4.
- Foda-se Rb vc vá gerir para o caralho.
- Esse está na sala nº5 nos preparativos e desinfeção geral, dentro de 15 minutos desloque-se para lá.
- Não é esse caralho.
- Então, é o da sala nº2?
- Não, seu filho de uma grande p...
- Essa só será operada amanha dr. Joachim. Bom trabalho. Aproveito para comunicar que atingiu a produtividade requerida, operou 4 gajos; passe pelos escritórios para receber o premiozinho.
- Mas...
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Rb

Anónimo disse...

Olá Zazie,

Monty forever

zazie disse...

eheheheheh Tenho sempre uma ataque de riso quando revejo este sketch. É das coisas mais loucas que alguma vez se fez.

Anónimo disse...

Zazie,

Quer que lhe faça um bolo de chocolate?

Joaquim

zazie disse...

E que tal serrar-me um joanete. Sabe?

Na volta, v. é mais é bolos

":OP

Luís Lavoura disse...

O primeiro comentário, do Carlos, está muito bom. Atinge perfeitamente o ponto.

Anónimo disse...

Tudo o diga respeito à saúde, os médicos passam ao lado... não é nada com eles... o que interessa é facturar...
É como na educação (sem a parte da facturação)... responsáveis pela calamidade? São a granel!... menos os professores!... na justiça são os Juízes! Está mal?... Eh pá, a culpa deve ser do carteiro que não entregou a notificação!...
Mas neste caso, então concordo com o PA: eles nem sequer lá estão... o Estado que passe a regime de exclusividade e eles passam a lá estar. -- JRF

Anónimo disse...

Joaquim! Eu aceito o bolo!... -- JRF

marina disse...

só gostava de saber uma coisa : as cirurgias são agendadas por ordem de chegada , tipo doentes em fila , ou os cirurgiões dão prioridade aos casos mais graves e complicados ? é que faz toda a diferença se as que ficam em espera são coisas menos graves e mais simples e rápidas de operar.

marina disse...

e é que se forem os cirurgiões a escolher faz todo o sentido que deixem para os incentivos as que fazem com uma perna às costas.

Anónimo disse...

Deixem de palrar sobre o que nãO sabem.

Cfe disse...

Dr. Joaquim,

Minha esposa trabalha na área de cirurgia.

E baseado nisto é que afirmei que o Prof. Arroja tem razão, condicionando a mesma aleatoriedade nos grupos comparados.

Desculpe-me lá porque não pretendo ofende-lo mas o que ouço em casa acerca da diferença do tempo gasto nas cirurgias parece-me derivar muito da pontualidade, rigor profissional, exigência e por aí a fora: que impactará no tempo total gasto.

CCz disse...

ahahahah