27 setembro 2013

Voltando ao básico V: Ética versus regulamentação (ex: código da estrada)

Podemos mais ou menos definir como regulamentação pública toda a espécie de normas de organização que existiriam de igual forma (com toda a certeza com muito mais eficácia) num regime de propriedade privada (e que inclui formas colectivas de propriedade)..

Existe um código de estrada? também existiriam normais de circulação em estradas privadas (de resto, como muitas foram construídas privadamente). São exigidos seguros contra danos a terceiros? Também o existiriam como normas privadas, na verdade, a extensão da obrigatoriedade de um seguro de responsabilidade civil e penal seria extensível como elemento obrigatório para acesso a locais, circulação, actividades várias. E isso acarretaria uma avaliação e certificação por parte de cada seguradora.

E o não cumprimento dessas normas? nas normais públicas, a tendência crescente é a criminalização. E nas normas que seriam privadas? O não cumprimento de normas de adesão obrigatórias tendem a prevenir pela simples proibição de acesso, ou a estarem sobre a alçada do direito civil. Seguros seriam por isso crescentemente exigíveis, e o uso de cauções também.

O que interessa aqui, é não confundir o que pertence ao campo da regulamentação, com o edifício de Ética, na medida em que define e analisa os actos onde a violência pode ser exercida legitimamente.

8 comentários:

Francisco disse...

Um dos argumentos libertários mais espantosos é a de que todas as instituições/normas estatais que são geralmente bem aceites iriam surgir espontaneamente numa sociedade libertária ideal, como defende aqui o CN. Eu até acho que isto contem alguma verdade, mas o absurdo é que os libertários querem fazer tábua rasa do status-quo, construir uma sociedade de novo, para que daqui a uns séculos, passada a barbárie inicial, voltemos ao status-quo outra vez. Mais coisa menos coisa o mesmo, mas como viria por ordem espontânea era outra coisa!

Porque uma das implicações das ideias do CN é que um determinado estado de coisas é absolutamente irrelevante. O que interessa é o passado: se tudo resultou de acções espontâneas e conformes ao direito natural então está tudo bem, independentemente das instituições/normas que surjam.

A consequência absurda desta ideia é que um libertário pode defender a destruição de uma sociedade e de uma cultura só para que ela renasça com uns ajustes, passado o tempo que fôr preciso para que a ordem espontânea faça o seu trabalho.

Francisco disse...

Esta forma de direito (basicamente a propriedade) completamente centrada no passado tem algumas características interessantes.

Forma-se uma narrativa ou uma mitologia, para segurar simbolicamente o novo status quo.

O que é preciso é que haja uma história bem contada, sem fios soltos, que convença que o estado de coisas actual é o final feliz e inevitável.

CN disse...

Mas quem é que deseja destruir o que quer que seja?

O estado moderno (com o advento das guerras mundiais) operou um autêntica destruição material e ideológica. Sim, inclui a social-democracia.

O caminho advogado será sempre: privatização, descentralização, localismo, e no limite, direito de secessão. E educação das boas normas e formas de pensar, quer economia quer filosofia (ainda que não académica).

Francisco disse...

CN,

é exactamente esse o meu ponto: o que você vê de pior no estado de coisas actual é o seu passado negro.

E tem um alvo para destruir: o estado moderno. Para que depois as instituições desse estado (saúde, educação, segurança social, regulamentação e certificação, etc) surjam do zero e espontaneamente voltem ao que são hoje.

CN disse...

"Destruir o estado moderno" não é destruir o que existe.

Só a relação de poder centralizado que sente legitimidade para manter as piores disfunções económicas e sociais.

E essa "destruição" em nada tem de ser violenta ou construtivista.

A crescente propriedade privada, e capacidade da sociedade civil em "virar-se2 provavelmente torna-rá essa centralização irrelevante. Como a URSS.

muja disse...

Mas ó CN, V. acha mesmo que o que descreve para aí, tem que ver alguma coisa com estados?

Tem, quanto muito, que ver com regimes políticos que permitem que o Estado seja capturado por interesses outros que não o interesse geral, e passe a servi-los em vez de servir a nação.

No Estado Novo, por exemplo, não se faziam leis absurdas. E desafio seja quem for a encontrar uma que seja.
O Estado não concorria para dissolver a sociedade. Preservava a soberania. Mantinha as contas de forma exemplar - que o mesmo que dizer que preservava a liberdade enquanto Estado, portanto enquanto país soberano. Cuidava do património nacional, de uma forma geral.

Ora, hoje o Estado faz precisamente o contrário. E é, essencialmente, o mesmo. Só tem é 40 anos em cima de todas as tropelias imagináveis. Mas é o mesmo.

E então? É o Estado ou é quem manda nele?

muja disse...

E quem lhe diz a si que a descentralização é sempre o melhor caminho? Idem para a privatização?

Porque é que não usam a cabeça? Não é evidente que o caminho depende daquilo que melhor convir ao país?
Não é evidente que há alturas em que o melhor é o Estado tomar o controlo de certo aspecto, enquanto noutras é melhor cedê-lo?

Não é evidente que isso, como tudo, depende?
Neste caso do interesse geral, comum ou nacional, como lhe queira chamar.

muja disse...
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