10 julho 2013

Padrão-ouro, capitalismo e tradicionalistas

A propósito do post "E em padrão-ouro".

Em padrão-mercadoria ortodoxo...

(ouro/prata/bitcoin/etc com 100% de reservas, ou seja, onde os depósitos-à-ordem não podem constituir crédito ao banco, retirando a capacidade a este de criar moeda para conceder crédito, restringindo-se assim ao que deve ser o seu papel de intermediação de poupança).

... ou qualquer regime monetário onde a quantidade de moeda seja estável, o crescimento económico materializa-se na redução de custos e preços nominais, o que é normal, porque o crescimento económico, em si mesmo, opera com a redução de custos e preços relativos, ou se quisermos, reais.

Neste estado de coisas, o facto dos preços descerem não se traduz em nenhuma dificuldade acrescida no serviço de dívida. Os preços descem naqueles pontos onde a produtividade foi aumentada, ou seja, por exemplo, numa empresa que tenha conseguido aumentar a margem de lucro (estado sempre precário e temporário, se em concorrência) e/ou o volume de vendas, tendo assim os meios para servir a mesma dívida nominal. Tal como, ceteris paribus, os salários nominais não têm de descer, sendo certo que se o tivessem (por variações na procura de moeda), ainda assim o poder de compra real seria aumentado.

Este seria o normal funcionamento de uma economia saudavelmente conservadora (não no sentido ideológico), que beneficiaria o pequeno aforrador (como a de pequenos e médios agricultores, a classe talvez mais prejudicada pelo inflacionismo), que pode quer acumular poupança monetária independentemente dos produtos financeiros oferecidos pela banca, sem enfrentar a sua desvalorização pela inflação; como a poderá aplicar com uma remuneração mais conveniente (dados os bancos deixarem de criar crédito), repartindo assim os benefícios de uma forma mais justa e natural com o empreendedor que busca financiamento, ainda que intermediado pela banca.

Evitar-se-ia assim o capitalismo artificialmente especulativo, alimentado por um sistema bancário que fornece crédito a juros artificialmente baixos, induzindo uma elite financeira-industrial com mais poder (e lucros) que o que seria natural, baseado numa pirâmide de crédito crescente e que serve também o poder político centralizado do estado moderno (o qual, como eu digo com frequência, será sempre um agente de transformação compulsiva da ordem social) e cuja relação com a banca é ambivalente. Numa pirâmide de crédito a solvabilidade dos estados e banca é interdependente. Seja qual for o regime político, por causa disso, esse mesmo regime tornar-se-à refém da lógica do sistema (outros dirão, "refém da banca") ou vulnerável às suas falhas.

Um regime monetário ortodoxo é uma peça fundamental para reconciliar o capitalismo [que em si significa a acumulação de poupança->investimento e não o acto de procura de crédito->criação monetária pela banca] com os tradicionalistas.

Aconselho a obra excelente do economista da escola austríaca: The Ethics of Money Production, JÖRG GUIDO HÜLSMANN (em pdf).

Na sua introdução podemos ler:
"First, this book applies the tradition of philosophical realism to the analysis of money and banking. The great pioneer of this approach was the fourteenth century mathematician, physicist, economist, and bishop, Nicholas Oresme, who wrote the first treatise ever on inflation and, in fact, the very first treatise on an economic problem. Oresme exclusively dealt with the debasement of coins, a form of inflation that is unimportant in our age. But the principles he brought to bear on his subject are still up to date and have by and large remained unsurpassed. In modern times, Oresme’s work has found its vindication in the writings of the Austrian School."
E o capítulo 13 versa sobre: "The Cultural and Spiritual Legacy of Fiat Inflation"

1 comentário:

Anónimo disse...

«Os preços descem naqueles pontos onde a produtividade foi aumentada, ou seja, por exemplo, numa empresa que tenha conseguido aumentar a margem de lucro...» CN
.
Então, vejamos, mas a produtividade do mundo tem aumentado... sem ouro-padrão.
.
O preço de venda ao público das cenisses que vamos comprando tem diminuído.
.
Porque é que as margens de comercialização não podem aumentar em não-padrão-ouro?
- aumentam, claro que aumentam. Aumentaram como nunca na história.
.
E aumentam porque as empresas crescem e percepcionam crescimento e, sobretudo, porque investem em inovação, tecnologia, marca, pessoal qualificado etc. Crescem porque os governos investem em pontes, estradas, escolas, justiça, saúde, ordem.
.
Rb