Recebi este email dirigido ao "autor da petição":
"Caro autor da petição:
Penso que a sua petição, apesar de bem intencionada, está baseada numa ideia errada de como funciona o sistema bancário. O problema não reside no facto dos nossos depósitos serem utilizados em negócios de risco, mas sim no facto dos bancos "inventarem" dinheiro que não existe. Os bancos emprestam muitas vezes mais do que dinheiro que têm em depósitos, com garantias dúbias ou inexistentes, e sabendo que esse dinheiro vai ser utilizado em negócios de risco (muitas vezes negócios que eles próprios gerem, como os derivativos). Fazem-no porque estão legalmente autorizados a isso, e a nível mundial. Precisamos duma revolução a nível mundial para alterar isso.
Cumprimentos, "
É bom saber que existe este tipo de sensibilidade quanto ao processo de criação de moeda por parte dos bancos e que deve ser dirigida para a percepção dos efeitos que tal provoca na indução de bolhas económicas.
Existe aqui um detalhe muito importante:
É o facto dos bancos poderem usar os depósitos à ordem como financiamento que confere a capacidade aos bancos de os criar para conceder crédito (e na verdade, podem criar depósitos para adquirir todo o tipo de activos, o segredo do negócio bancário é conseguir que essa nova moeda circule entre clientes do banco, ou seja, dentro do próprio balanço).
Partindo de um ponto inicial de 100% de reservas relativamente aos depósitos à ordem:
Activo: 100€ em caixa (ou reservas).
Passivo: depósitos à ordem de 100€.
Num segundo momento passamos a:
Activo: 100€ em caixa + crédito concedido de 100€.
Passivo: depósitos à ordem de 200€.
Assim, olhando para o resultado final é (ou parece) igualmente verdade dizer:
- O Banco utilizou 100€ de depósitos à ordem para conceder crédito de 100€.
- O Banco criou 100€ de depósitos à ordem para conceder crédito de 100€.
Mas apenas o facto da legislação deixar que os depósitos à ordem sirvam de financiamento aos bancos (ou seja, a legislação especial acabou por legalizar o que anteriormente constituía uma fraude no domínio do contrato de depósito civil) confere a capacidade do banco criar moeda criando novos depósitos à ordem. Ou seja, sem depósitos à ordem como financiamento, os bancos deixam de poder operar a expansão de crédito e moeda. E só isso pode prevenir a formação de bolhas e crises bancárias.
PS: quanto à discussão no domínio da teoria económica sobre se o crescimento tem alguma espécie de dependência directa com o crescimento nominal do stock de crédito e moeda terei todo o prazer em abordar noutra altura.
16 comentários:
O sistema bancário pode expandir a moeda, matematicamente, por nove vezes, no limite.
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Não vejo mal nenhum nisso. pelo contrario. É isso que permite que o Capitalismo exista.
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O que eu vejo que esteve mal é na desregulação operada por parte dos Bancos Centrais, nomeadamente no controle de activos. Da sua qualidade vs quantidade.
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Isso sim. Não é nada mau que o meu dinheiro depositado, seja ele DO ou DP, sirva para financiar a economia. Se não fosse assim ainda viveriamos na idade média.
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O que se exige é que não possa servir para outras cenisses que não sejam o financiamento à economia.
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Por exemplo, que sentido faz que o meu deposito sirva para especular nos mercados dos derivados????
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Não faz sentido. Porque é um mercado sujeito a perdas volumosas (ou ganhos) instantaneas e isso sim, coloca em risco a SOLVABILIDADE da instituição.
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Rb
Rb
Ao expandir a moeda, diminui artificialmente a taxa de juro induzindo a impressão que mais projectos de investimento são sustentáveis quando não o são realmente.
Isso cria as bolhas e as crises, que frequentemente provocam corridas aos bancos, e etc.
CN,
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Há dois tipos de taxa de juro:
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- A taxa de juros com a expansão da moeda é o preço da simples interacção das forças de mercado. Da lei da oferta e da procura.
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- Outra coisa são as taxas de juros de referência dos bancos centrais que tem a ver com a politica de oferta de moeda - QE -.
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Não vale confundir os dois conceitos. Hayek chamava à primeira taxa, creio, de Taxa Natural. Keynes achava que podiamos usar a Taxa de referência para induzir Taxas Naturais mais baixas ou mais altas de acordo com o estado da economia em cada momento.
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Rb
A complicação de Hayek, que ele próprio admitiu, deveio do facto de ele não conseguir calcular a Taxa Natural. Ele queria ser tão perfeccionista que achava que cada produto de mercado teria uma taxa natural distinta.
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E confessou isso a Keynes. Essa dificuldade em saber a Taxa Natural de cada produto.
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Sabe o que é que Keynes lhe respondeu???
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Oh Hayek faça uma média. ahahahaha
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Ai jasus.
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Rb
RB
Hayek deu demasiada trela a Keynes, que trocava conceitos, contradizia-se etc.
Se a moeda se expande para conceder crédito obviamente a taxa de juro é mais baixa do que seria se tal crédito dependesse da poupança anterior de terceiros que acordariam numa dado juro para conceder esse crédito.
Mas oh CN, a moeda não se expande sozinha. Precisa de companhia. Ela expande-se porque existem clientes que a fazem expandir através do crédito. Os bancos não resolvem expandir a moeda porque lhes apetece muito. Nada disso. A expansão é consequência de várias coisas, todas elas relacionadas com a procura de crédito ou influênciadas pela Oferta de moeda do Banco Central.
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Rb
«Hayek deu demasiada trela a Keynes» CN
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Por acaso foi ao contrário. Hayek tinha uma admiração e fixação incrível por Keynes.
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E Keynes reconhecia-lhe imenso valor em algumas partes do pensamento de Hayek. E até aproveitou alguns estudos deste.
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Só não estavam de acordo numa coisa:
- Intervenção. Keynes achava que era dever dos economistas tratarem de encontrar soluções para as crises de forma activa. Hayek considerava uma perda de tempo; ele achava que se deveria deixar que as forças de mercado se degladiassem porque e equilibrio seria alcançado algures no futuro. Keynes respondia que no futuro podiamos estar todos mortos. Hayek contra-argumentava que era preciso morrer alguns para salvar outros.
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Rb
"Ela expande-se porque existem clientes que a fazem expandir através do crédito."
Rb, olhou para o post? Ela expande-se porque os bancos podem criar depósitos à ordem para conceder crédito. Se assim não fosse, como seria natural, o banco teria de oferecer uma taxa de juro superior a clientes para os convencer a dar crédito ao banco e este depois conceder ao seu credor com margem financeira.
CN,
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Deixe-me dizer-lhe uma coisa. As bolhas não tem propriamente a ver com a taxa de juro. Nada disso. Isso é uma percepção ERRADA da realidade, que é muito frequentente nos Austriacos.
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Vejamos, vamos nos centrar na tal Bolha Imobiliária:
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- Vc e eu vamos a um banco pedir um Empréstimo e colocamo-lhes dois projectos para Financiar:
a) O CN apresenta um projecto para adquirir um Maquina Industrial xpto e apresenta um projecto de investimento maravilhoso
b) O Rb apresenta um projecto para construir um condominio de casas, igualmente xpto, e com um retorno semelhante ao que o projecto do CN iria ter.
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Qual acha que seria o projecto eleito para Financiar???
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- Pois eu digo-lhe, os bancos estão a marimbar-se para o seu projecto ( e para o meu). O que os bancos escolhem é o projecto que MAIORES GARANTIAS lhes dão.
- O seu projecto tem uma GARANTIA de uma maquina, cujo valor venal, caso a coisa dê para o torto, não vale um chavo.
- O meu projecto tem uma GARANTIA REAL do próprio imovel.
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A escolha é simples e lapidar. Os bancos financiam aquilo que lhes dá maiores garantias.
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A taxa de juro é semelhante nos dois projectos. Compreende? É a txa euribor e uns pózinhos no spread.
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Assim, as bolhas tem quase sempre a ver com as Garantias e menos com as Taxas de Juros cuja cotação é uma simples consequencia e não a causa. Excepto quando se faz o QE.
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E se pensar que, estes créditos que se foram concedendo, porque eram mais seguros para os bancos do que os outros, se fundiram em pacotes atraves dos fundos de investimento e que foram revendidos pela aldeia global, verá que o problema não foi a taxa de juros, mas sim e sempre as Garantias subjacentes.
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Rb
Projectos com rentabilidade acima da taxa de juro (ou na terminologia custo médio do capital) tendem a ir para a frente.
Se o crédito é dado por exapansão de moeda taxa de juro é abaixo do que seria para a mesma procura de crédito.
Isso incentiva projectos de capital, aumento de preços e salários nesse sector, o que induz uma bolha que se transmite pela economia até... até rebentar.
É quase como aquela ideia maluca do Chipre (que entretanto já foi negada) de ir liquidar parte da dívida virtual com dinheiro real (ouro).
O Rb diz que sem crédito ainda viveríamos na Idade Média...
Mas será?
Que pensam Vs. do Venture Capital?
É que, para mim, não faz sentido nenhum ir a um banco pedir dinheiro emprestado para abrir um negócio. Pela simples razão de que o banco não vai partilhar o risco.
Se o meu negócio falir, o banco não perde necessariamente o dinheiro que me emprestou (e que nem sequer tem): eu fico a dever ao banco. Como diz o Rb, depende de garantias. Se eu não puder pagar, o banco fica-me com as garantias: que podem ser a minha casa, etc. O banco está-se nas tintas para o sucesso do meu negócio: não me vai apoiar nem não me vai guiar. Para quê? Tem as garantias. Vai tentar é sugar-me o máximo possível.
Ou seja, caso o negócio corra mal, vai a vidinha para o galheiro. Logo, se eu quiser abrir um negócio, tenho de ter muito cuidado e planear para risco mínimo ou controlado, o que por sua vez vai causar entraves à agressividade do negócio, desde a expansão geográfica até à inovação tecnológica.
Mas se eu encontrasse alguém, disposto a financiar-me, mas que em vez de garantias, quisesse uma boa fatia dos lucros que venham a acontecer se acontecerem, então temos uma excelente situação: eu - o empresário - posso planear o meu negócio mediante o que acho mais plausível de sucesso, sem estar preocupado que, em caso de falha, vá a minha vida para o galheiro. Se eu tiver sucesso, a parte da empresa que alienei em troca do investimento é um custo mínimo comparado com viver debaixo da ponte. Para o capitalista - o que detém o capital, mas detém mesmo, não o inventa - em caso de sucesso multiplica o investimento: excelente. Em caso de falhanço, uma vez que é muito rico e terá provavelmente um portfolio diversificado, o prejuízo encaixado não causará mossa porque, de qualquer maneira, bastar-lhe-á um investimento bem sucedido para compensar vários falhados e ainda ter lucro.
Além do mais, é do maior interesse para um capitalista (o verdadeiro, este) uma vez investido o seu capital, oferecer o máximo apoio e todo o conhecimento e contactos que possua ao receptor do capital investido para que este possa ter a máxima probabilidade de obter sucesso - que se traduz em lucro para o investidor.
Isto, sim, é capitalismo. O resto é escroquerie e parasitagem.
É o capital acumulado que é essencial. Não é o crédito. E a diferença esta na partilha do risco. No crédito não há risco para o credor, desde que as garantias sejam sólidas - é claro que quando não são, temos as bolhas. Mas quando são sólidas, então e por isso mesmo, não vão ser arriscadas de ânimo leve por quem as ofereceu: logo, a economia vai crescer devagarinho, cheia de medo.
Num sistema capitalista a sério, os bancos são secundários ou não-essenciais: servem para guardar o dinheiro e fazer pequenos empréstimos - que foi exactamente como começaram. São parasitas. E como parasitas, ainda que por vezes úteis, devem ter trela curta. Muito curta. Que é exactamente o contrário do que têm hoje em dia, que só pode ser descrito, em estrangeiro, como free-reign.
Perfeitamente Muja. O Capital de Risco deveria substituir-se aos bancos na concessão de crédito, exactamente pelos motivos que o Muja apontou. Os bancos interessam-se por garantias, as Capital de Risco interessam-se pelas Rentabilidades dos Negócios financiados. E isso faz TODA a diferença.
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Rb
Mas olhe, Muja, nos EUA os bancos não agem como os de cá. Correm riscos de negócio.
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É por isso que não se pode avaliar as coisas como se todos os paises fossem iguais e recomendar curas internacionalistas. O que lá resulta, não resulta cá.
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Rb
Não sendo eu economista, ficava um pouco mais descansado se houvesse alguma menção do conceito de transformação de maturidade de depósitos.
"Maturity transformation", em estrangeiro, como diz o PA. A Wikipedia é parca, mas aqui há uma explicação verbosamente divertida: http://unqualified-reservations.blogspot.com/2008/09/maturity-transformation-considered.html
(E, oh gentes: o "venture capital" é o modelo de criação de cavalos de corrida - idealmente, um ganha o grande prémio, dois têm resultados sofriveis, o resto do estábulo é para abate. "Rinse, repeat". Mas "os cavalos também se abatem" não é modelo para funcionamento geral do comércio e indústria.)
Boa, que conversa interessante entre o Mujah e o Morgadinho
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