O João Miguel Tavares, que eu conheci por ocupar o espaço temporariamente deixado vago pelo VPV, é um católico dos quatro costados. Por ser um crítico da Igreja Católica e por ter ideias próprias sobre o que esta deve ser, como qualquer católico que se preze.
Além disso, escreve bem e consegue pôr um “spin” na sua crónica de hoje no Público que lhe augura um futuro promissor, num País que prefere o virtual ao real.
A sua peça, jocosamente intitulada Papa interrompido, não cai em qualquer interrupção. É demagógica do princípio ao fim, embora com entrada de leão e saída de sendeiro.
JMT começa por fazer publicidade ao documentário Mea Máxima Culpa, do Alex Gibney, afirmando que este ‹‹não deixa quaisquer dúvidas sobre as responsabilidade da hierarquia da Igreja Católica no encobrimento de milhares de casos de pedofilia em todo o mundo››.
De seguida afirma que ‹‹Alex Gidney começa em Murphy (padre pedófilo do Milwakee) e acaba em Ratzinger, e é a linha que leva de um a outro que é exibida com uma clareza inédita››.
Eu penso que este raciocínio permite conclusões exageradas que não estariam na mente do autor, mas que este facilita ao leitor.
Depois, JMT afirma que Ratzinger procurou manter a imagem da Igreja Católica como instituição exemplar, sobrepondo os interesses da organização aos ‹‹dos mais desprotegidos››. E porquê?
Porque ‹‹Há uma lógica fundamentalista que dá sentido a essa protecção. “Ninguém tem direito a receber o sacramento da Ordem”, lê-se no catecismo. “É-se chamado a ele por Deus.” E se é Deus quem chama, quem é o Homem para dizer que um pedófilo não pode ser padre”. Eis a armadilha ontológica do sacerdócio católico: tanto se quer aproximar o padre da imagem de Cristo que a Igreja perde a capacidade para lidar com a sua mais trágica humanidade.››
Aqui, JMT demonstra uma cultura teológica que me ultrapassa. Eu não considero Joseph Ratzinger um fundamentalista — como ficou demonstrado com a sua resignação — nem reconheço quaisquer armadilhas ontológicas no argumento invocado. Vejamos, todas as vocações podem ser consideradas um chamamento de Deus a que ninguém tem direito, mas isso não impede as instituições de porem cobro a comportamentos desviantes. A pedofilia, por outro lado, parece-me mais um chamamento do diabo do que de Deus e a Igreja pode bem pôr-lhe cobro, como tem vindo a fazer.
Mais adiante, JMT desenterra os Vatileaks, para dizer que ‹‹se percebe a dimensão homérica de intriga palaciana, e a incapacidade do Papa em lidar com ela››.
“Et tu Brute”? Caro JMT, você aqui caiu numa armadilha em que o VPV nunca teria caído. Todo o poder vive rodeado de intrigas e quando o poder é grande as intrigas têm uma dimensão homérica. Não se consuma porém, este lapso não retirou qualquer dimensão retórica à sua crónica, apenas demonstrou o seu génio para o “spin”.
Por fim, eis o clímax. O gesto de Joseph Ratzinger pode ‹‹obrigar o Vaticano a descer das nuvens onde tem escondido as maiores barbaridades em nome de uma pureza falsa como Judas››. Por favor, qual é a organização com 2000 anos que não tem alguns esqueletos no armário. Temos é de recordar as palavras de Jesus: “O meu Reino não é deste mundo”. A Igreja Católica não é e nunca será uma instituição mundana porque o Reino de Deus não é deste mundo, e por isso a Igreja não poderá nunca "descer à Terra". Fazê-lo seria o fim do catolicismo.
Mal posso aguardar pelo regresso do VPV, prefiro um bom vintage a este alcopop.
5 comentários:
Joaquim,
Bem observado.
A semana passada, quando ele foi apresentado como novo colunista do Público, ainda comecei a ler o artigo. Mas, logo no segundo parágrafo, já estava a falar daqueles codilhos do Costa e do Seguro, e nesse momento desliguei.
Hoje, nem olhei.
PA
Joaquim,
Esse Gibney de que ele fala é estrangeiro, não é?
Para ter a verdade deve ser estrangeiro.
PA
Que cambada de saloios.
PA
Hum,
Gibney? Gibney parece ter um algo, um nao sei que que de nao ser estrangeiro parecería.
Mais do que nao há nenhuma dúvida e de que Ratzinger é um produto totalmente nacional...
E, já agora, convém dizer de que barbaridades concretas estamos a falar.
Porque uma coisa é barbaridades tipo pedofilia, outra é "barbaridades" tipo estar contra o aborto, o preservativo, ou o sacerdócio das mulheres. O que, convenhamos e por mais que os iluminados modernos queiram, ainda não estão na mesma categoria.
Hoje em dia há muito a mania de que se pode dizer assim umas larachas tipo ah e tal a Igreja comete barbaridades! Mas quais? Quando? Como? A Igreja em si? Através de quem?
Enviar um comentário