04 março 2012

sector voluntário

A razão por que Portugal, seguindo o caminho da Grécia, não irá cumprir os objectivos orçamentais comprometidos com a troika, está aqui. Muitos portugueses estão a ficar com rendimentos mais baixos, outros desempregados, e uma boa parte deles está a passar-se para o sector informal da economia e para o sector voluntário.
No sector informal existem ainda transacções, mas elas escapam aos circuitos oficiais e ao pagamento dos impostos. O sector voluntário é o reino da economia do amor ou da caridade - a economia assente na dádiva. Um desempregado que vai viver para casa dos pais, a avó que passa a tomar conta dos netos em lugar de eles irem para o infantário, a paróquia que fornece alimentos aos pobres, o grupo de amigos que se reune e invariavelmente paga o jantar àquele que não o pode pagar.
O sector voluntário da economia está sobretudo assente na família e no círculo de amigos, embora outras instituições de beneficência, a começar pela Igreja Católica, sempre tenham desempenhado nele um papel igualmente importante. No sector voluntário as transacções possuem um só sentido, não existindo reciprocidade, e são geralmente em espécie. Não entram no PIB, mas as necessidades que elas visam satisfazer ficam igualmente satisfeitas: o neto continua guardado, agora pela avó, e não mais pelo infantário; o filho continua com alojamento, embora em casa da mãe, e não mais em apartamento alugado.
Nos países protestantes do norte da Europa, a família não tem, nem de longe, a importância e a tradição que tem nos países católicos do sul, como Portugal. É muito difícil imaginar um sueco de 30 anos que perde o emprego, a recolher-se a casa dos pais ou à ajuda dos amigos. Tal significa que nos países do norte da Europa o PIB é uma medida muito mais fiel da dimensão da actividade económica do que nos países do sul. Aqui, o sector voluntário, que não entra no PIB, constitui um abrigo económico que não está disponível - certamente que não em dimensão comparável -, nos países do norte.
Para além do estrangeiro e do sector informal, os portugueses estão a migrar em força para o sector voluntário da economia. A receitas fiscais caem a pique, e o ministro das finanças - e, em breve, também, os elementos da troika - ficam admirados. Tanto mais que não há ainda ninguém a dormir nas ruas.

Sem comentários: