Caro Álvaro,
Escrevo-lhe por genuína simpatia pela sua pessoa e porque vejo nela vários pontos em comum com a minha.
Você cometeu ontem o terceiro erro que fará desta sua passagem pelo governo a pior experiência profissional da sua vida, e isto aos seus próprios olhos, não aos meus. Foi ao aceitar o pedido do primeiro ministro para não se demitir já, e aguardar por uma oportunidade mais favorável. Já deve ter percebido que a oportunidade mais favorável é para ele, não para si.
A verdade na nossa cultura é trinitária, e o erro de ontem completou a trindade. O primeiro foi ter aceite o cargo de ministro - e eu previ na altura o que iria acontecer; o segundo foi ter dito aos jornalistas para o tratarem por Álvaro; o terceiro, foi o de ontem.
Eu não gostaria de perder muito tempo com o primeiro, a fim de me poder concentrar sobre o segundo e o terceiro. Excepto para lhe pôr duas questões: você, que tem uma profissão dedicada à procura da verdade, e vivia num meio académico que lhe permitia dedicar-se com razoável liberdade a essa actividade, decide trocar esse meio por um outro em que imperam as aparências, a mentira, as falsas promessas, a dissimulação, a pequena traição e o erro? Foram políticos pertencentes à mesma cultura dos seus colegas do governo que levaram o país à ruina, como é que você pôde acreditar - embora as pessoas sejam outras, a cultura é a mesma - que seriam eles a tirá-lo agora da ruína?
Você vivia há muitos anos num país com uma verdadeira tradição democrática, e quando disse aos jornalistas para o tratarem por Álvaro estava a dar provas de genuíno sentimento democrático. Num regime democrático, um ministro é um representante da vontade do povo e, para ser um representante a sério, tem de ser igual ao povo. Daí a sua disponibilidade para se pôr ao nível do povo, começando pelos jornalistas.
O seu erro foi não ter percebido que os portugueses não têm, nem nunca tiveram, uma cultura democrática. A cultura portuguesa é absolutista, e nela um ministro é visto como uma espécie de vice-rei com poderes quase absolutos e muito acima do povo. Nesta cultura, um ministro dá ordens ao povo, não se põe ao nível do povo. É isso que o povo espera.
Você não se devia ter deixado levar pelas aparências segundo as quais 90 em cada 100 portugueses se dizem democratas, alguns desde o berço. Se amanhã o regime mudar da democracia para outro “ia” qualquer, você continuará a encontrar 90 em cada 100 portugueses - embora não os mesmos - a dizer que são “atas” desse novo regime, e alguns também desde o berço.
Por isso, em lugar de interpretarem a sua disponibilidade em ser tratado por Álvaro como um sinal vindo de um genuíno democrata, eles ficaram sem saber o que fazer disso. E, não sabendo o que fazer, riram-se, troçaram de si.
Passemos agora ao último erro. Quando um homem toma uma decisão, especialmente no meio em que você agora está inserido, deve executá-la sem hesitação. Ao ter aceite prolongar a sua estadia no governo, você está aí para viver as piores semanas da sua vida profissional. Vai ser abusado por todos os lados. Os funcionários do seu ministério deixarão de obedecer às suas ordens. Os seus colegas ministros vão saquear tudo aquilo que dá poder no seu ministério, sem que você possa contê-los. Os jornalistas vão-se divertir consigo. Tudo isto porque você fez um favor ao primeiro-ministro. Mas arrependa-se, arrependa-se já, porque nem ele lhe vai agradecer. Quando chegar a altura de se ver livre de si, é ele que aparecerá em público a demiti-lo, não você a demitir-se. São as regras do jogo nesse meio, fazer parecer mal o outro para que eu possa parecer bem.
Você cometeu ontem o terceiro erro que fará desta sua passagem pelo governo a pior experiência profissional da sua vida, e isto aos seus próprios olhos, não aos meus. Foi ao aceitar o pedido do primeiro ministro para não se demitir já, e aguardar por uma oportunidade mais favorável. Já deve ter percebido que a oportunidade mais favorável é para ele, não para si.
A verdade na nossa cultura é trinitária, e o erro de ontem completou a trindade. O primeiro foi ter aceite o cargo de ministro - e eu previ na altura o que iria acontecer; o segundo foi ter dito aos jornalistas para o tratarem por Álvaro; o terceiro, foi o de ontem.
Eu não gostaria de perder muito tempo com o primeiro, a fim de me poder concentrar sobre o segundo e o terceiro. Excepto para lhe pôr duas questões: você, que tem uma profissão dedicada à procura da verdade, e vivia num meio académico que lhe permitia dedicar-se com razoável liberdade a essa actividade, decide trocar esse meio por um outro em que imperam as aparências, a mentira, as falsas promessas, a dissimulação, a pequena traição e o erro? Foram políticos pertencentes à mesma cultura dos seus colegas do governo que levaram o país à ruina, como é que você pôde acreditar - embora as pessoas sejam outras, a cultura é a mesma - que seriam eles a tirá-lo agora da ruína?
Você vivia há muitos anos num país com uma verdadeira tradição democrática, e quando disse aos jornalistas para o tratarem por Álvaro estava a dar provas de genuíno sentimento democrático. Num regime democrático, um ministro é um representante da vontade do povo e, para ser um representante a sério, tem de ser igual ao povo. Daí a sua disponibilidade para se pôr ao nível do povo, começando pelos jornalistas.
O seu erro foi não ter percebido que os portugueses não têm, nem nunca tiveram, uma cultura democrática. A cultura portuguesa é absolutista, e nela um ministro é visto como uma espécie de vice-rei com poderes quase absolutos e muito acima do povo. Nesta cultura, um ministro dá ordens ao povo, não se põe ao nível do povo. É isso que o povo espera.
Você não se devia ter deixado levar pelas aparências segundo as quais 90 em cada 100 portugueses se dizem democratas, alguns desde o berço. Se amanhã o regime mudar da democracia para outro “ia” qualquer, você continuará a encontrar 90 em cada 100 portugueses - embora não os mesmos - a dizer que são “atas” desse novo regime, e alguns também desde o berço.
Por isso, em lugar de interpretarem a sua disponibilidade em ser tratado por Álvaro como um sinal vindo de um genuíno democrata, eles ficaram sem saber o que fazer disso. E, não sabendo o que fazer, riram-se, troçaram de si.
Passemos agora ao último erro. Quando um homem toma uma decisão, especialmente no meio em que você agora está inserido, deve executá-la sem hesitação. Ao ter aceite prolongar a sua estadia no governo, você está aí para viver as piores semanas da sua vida profissional. Vai ser abusado por todos os lados. Os funcionários do seu ministério deixarão de obedecer às suas ordens. Os seus colegas ministros vão saquear tudo aquilo que dá poder no seu ministério, sem que você possa contê-los. Os jornalistas vão-se divertir consigo. Tudo isto porque você fez um favor ao primeiro-ministro. Mas arrependa-se, arrependa-se já, porque nem ele lhe vai agradecer. Quando chegar a altura de se ver livre de si, é ele que aparecerá em público a demiti-lo, não você a demitir-se. São as regras do jogo nesse meio, fazer parecer mal o outro para que eu possa parecer bem.
Por isso, demita-se e demita-se já.
E gostaria de terminar dizendo-lhe que, por muito mal que se vá falar de si nas próximas semanas, eu tenho de si a ideia de um homem sério, de um académico e de um economista competente, e de um verdadeiro democrata.
Sem comentários:
Enviar um comentário