Se nos abstrairmos da natureza divina de Cristo, e nos concentrarmos apenas no homem cuja vida é descrita nos Evangelhos, aquilo que salta aos olhos é a figura de um propagandista, e de um propagandista de se lhe tirar o chapéu. Ele tem uma capacidade de persuasão absolutamente invulgar. Ele convence praticamente toda a gente que lhe aparece pela frente, ele cria um grupo de fiéis à sua volta, ele atrai seguidores, ele arrasta multidões.
Compreende-se que um homem rico ou poderoso consiga persuadir muita gente. As pessoas são atraídas a ele na esperança de aprenderem com ele e de se tornarem como ele. Mas aquele era um homem totalmente diferente, um pobretanas esfarrapado e a barba por fazer, que parecia não ter nada para oferecer a ninguém, excepto palavras. Quem se concentrar exclusivamente na figura humana daquele homem, aquilo que acaba por concluir é que ele era um grande propagandista, dos maiores que a humanidade já conheceu.
E é isso que fazem os protestantes. Eles concentram-se exclusivamente na figura daquele homem ("Solo Christus"), e não querendo saber da sua origem divina, eles acabam por se concentrar exclusivamente na figura humana de Cristo. E, seguindo-lhe o exemplo, acabam por se tornar como ele - exímios propagandistas. A cultura protestante é uma cultura de propagandistas.
E o que é um propagandista? É, em primeiro lugar, um homem que visa persuadir os outros, normalmente em benefício próprio, e independentemente dos méritos da sua mensagem, isto é, de ela ser verdadeira ou falsa. E, olhando bem, as instituições modernas que foram criadas pelo protestantismo, são instituições baseadas na propaganda. Estão neste caso, o Estado social-democrata ou Estado-Providência, que é uma criação do protestantismo germânico; e a ideia moderna de mercado que é um criação do protestantismo britânico.
Que o mercado, na sua visão moderna, assenta, em grande parte, na propaganda (ou marketing) é conhecimento de todos. O marketing visa persuadir as pessoas que uma certa coisa possui qualidades que ela não tem, ou que só em parte tem; que outra coisa visa satisfazer necessidades que as pessoas não têm, mas que deviam ter; que ainda outra coisa satisfaz melhor uma necessidade existente do que outra que ainda está em perfeitas condições de utilização.
O objectivo do marketing não é propriamente enganar as pessoas. É seduzi-las através de uma mensagem, e independentemente dos méritos dessa mensagem, de ela ser verdade ou mentira.
O moderno Estado democrático e socialista, ou social-democrata, depende ainda mais da propaganda, porque o luteranismo germânico despreza mais a verdade do que o anglicanismo. Ainda no domingo passado, numa entrevista à RTP-2, o Dr. Mário Soares foi interpelado pela jornalista, ainda jovem mas bem preparada, acerca dos seus discursos de extrema-esquerda nos anos 70, logo a seguir ao 25 de Abril. Ele sorriu, acenou afirmativamente coma cabeça, e disse: "Eu não acreditava nada naquilo que estava a dizer, mas tinha de o dizer, porque era o ambiente da época. Senão, como é que eu tinha ganho as eleições?", enquanto a jornalista sorria e o contemplava como se ele estivesse a relatar um acto heróico.
O político democrático moderno é o propagandista por excelência. Não se pode dizer que ele seja um homem mentiroso, porque às vezes ele fala verdade; não se pode dizer tão pouco que ele seja um homem verdadeiro, porque às vezes ele fala mentira. Aquilo que o caracteriza é o seu desprezo pela verdade, a sua capacidade tão depressa para falar verdade como logo a seguir para falar mentira, segundo os seus interesses pessoais e do momento.
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