27 janeiro 2012

Tourist Information Office

À distância de quatro anos, eu penso que identifiquei neste post, sem na altura o pretender e descontado o exagero, algumas das características culturais católicas que tornam Portugal e os outros PIGS, países menos produtivos que a Alemanha, a Suécia, a Holanda ou os EUA.

A primeira e, talvez, a mais importante, é a sua propensão comunitária que os leva a viverem todas as questões da vida em grupo (comunidade), e a que me referi extensivamente em posts mais recentes.

Mas existem outras. Logo no parágrafo inicial, a Cristina Keller, nas indicações que fornece ao JCD acerca de como proceder assim que chegasse a Portugal, introduz os taxistas do aeroporto como um bando de ladrões. Ainda por cima a coisa é dita a um turista que visita pela primeira vez o país e oriundo de uma cultura protestante, cujo espírito é propenso às generalizações. Se os taxistas do aeroporto são ladrões, porque é que os outros hão-de ser diferentes? E se todos os portugueses que são taxistas são, afinal, ladrões, porque é que os outros portugueses, que não são taxistas, não serão também ladrões? Conclusão: todos os portugueses são ladrões. Nada de mais produtivo para promover o turismo em Portugal.

A figura do José da Silva (Zeca) é talvez aquela que reune o maior número de características culturais portuguesas e católicas. Ele celebra os acontecimentos importantes em grupo (comunidade) e faz parte de uma família de 11 pessoas que veio expressamente de Torres Vedras. Era um dia de semana, aquele dia 23 de Abril, e ele pediu ao patrão que lhe desse a manhã para ir esperar o primo Leonel ao aeroporto (ele que experimentasse fazê-lo na Alemanha...).

A sua solicitude, a raiar a subserviência, para ajudar o próximo - especialmente se fôr estrangeiro - é enorme. Ele não consegue resolver o problema do JCD, mas rapidamente recorre a um familiar, que é assim desviado daquilo que estava a fazer. Chama o cunhado, de nome Chico. E como se o cunhado também não conseguisse resolver o problema, ele pega pelo braço de um açoreano que ia a passar com malas pesadíssimas nas mãos e desejoso de chegar ao seu destino.

A humildade, por vezes a falta de auto-estima ou o sentimento de incapacidade, que é característico de um povo de cultura católica, também está presente na personalidade do Zeca, e esse sentimento é produzido pelas mulheres. Quando a mulher se aproxima e se dirige a ele e ao irmão, basta-lhe uma frase aparentemente inócua - "Mas então vocês não conseguem ajudar o rapaz?" -, mas carregada de sentido - "Mas que raio de homens é que vocês são?" - para pôr os homens numa atitude defensiva. O Zeca torna-se imediatamente justificativo dizendo que ela sabe que ele de línguas não percebe nada, só das de vaca, e desde que sejam cozinhadas por ela - esta é também a maneira de a aplacar.

E desfere, em seguida, um golpe de morte sobre o cunhado, ao mesmo tempo que continua a justificar-se perante a mulher - "... o teu irmão é que tem a mania que sabe falar em estrangeiro...", reflectindo a pequena inveja que é própria de uma cultura fortemente comunitária. O Chico tinha a reputação - única na família - de saber falar estrangeiro. Com aquela pequena frase, como quem não quer a coisa, o Zeca manchou-lhe a reputação para sempre. Nessa altura, o Chico vai aos arames e com razão, porque a sua reputação de saber falar estrangeiro, que lhe custou uma vida a ganhar e era a razão da sua importância intelectual na família, acaba de ser desfeita ali, aos olhos de todos, e em poucos segundos. Ele bem tenta explicar a diferença entre o francês e o americano, mas ninguém quer saber. Aquilo que toda a gente viu é que ele não conseguiu falar com o estrangeiro.

A tendência de um povo de cultura católica para se afastar do essencial e divergir para o detalhe e o acessório, senão mesmo para o irrelevante, atravessa toda a cena. A questão central era a tradução da expressão El Jodillón de las Pampas para português, mas rapidamente os portugueses se dividem em grupos a discutir a localização das Pampas, o futebol, os aeroportos, a intensidade dos ventos, as políticas de educação, o Governo, e até a moral, na conversa das duas mulheres que encerram a história.

Esta falta de auto-confiança leva frequentemente os povos de cultura católica a recorrerem á autoridade para lhes resolver os problemas. Quando a autoridade é bronca - e num país de cultura católica isso pode acontecer - é tempo perdido e, por isso, totalmente improdutivo. Assim acontece quando as mulheres se dirigem ao polícia com o papelinho onde estava escrito El Jodillón de las Pampas e ele, consultando o roteiro de Lisboa, lhes responde que essa rua não existe.

Não é possível com esta cultura católica - comunitária, pronta para judar o próximo, com tendência para a divagação e a fantasia, feita de pessoas muito diferentes, e às vezes radicais, moralista, emotiva, e em que o tempo parece não ter valor -, ambicionar a produtividade que existe na Alemanha.

Então, e como é que se resolvia este problema na Alemanha? O alemão inteceptado no átrio do aeroporto de Frankfurt pelo JCD - no caso de aceder parar para o ouvir, algo que não é certo -, apontava-lhe a direcção do Tourist Information Office e ele que fôsse lá perguntar. Pelo contrário, na Portela estiveram parados mais de quarenta portugueses para prestar um serviço gratuito, que nem sequer conta para o PIB, ao passo que os serviços prestados pelo Tourist Information Office contam.

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