21 dezembro 2011

a última

A cultura popular católica é uma cultura de imitadores. Tudo aquilo que existe no mundo, um povo de cultura católica ambiciona também ter, porque só assim a sua cultura se mantém católica ou universal. Desde o 25 de Abril, em que o povo passou a governar, não é fácil encontrar uma nova instituição no país que não seja uma imitação de alguma instituição estrangeira – normalmente dos países protestantes do norte da Europa ou da América do Norte, que, aos olhos do povo católico, são considerados os países avançados.

Está neste caso o Estado-Social ou Estado-Providência. O moderno Estado-Providência é uma criação do muito anti-católico chanceller alemão Otto von Bismarck.

Durante muitos séculos, foi a Igreja Católica que por toda a Europa, incluindo a Alemanha, assegurou grande parte das funções ditas sociais, como a assistência aos pobres e idosos, a educação e a saúde. Porém, no seguimento da reforma religiosa, que teve o epicentro na Alemanha, e com a perseguição à Igreja, sobretudo no norte do país, havia que encontrar uma instituição que substituísse a Igreja nessas funções. Assim nasceu o Estado-Social. Nos países protestantes, O Estado substituiu a Igreja nas funções sociais e tornou-se a principal instituição de assistência social.

Desde 1974 o Estado português foi aquele que mais cresceu em toda a Europa Ocidental, passando a sua despesa em termos do PIB de 20% em 1974 para mais de 50% actualmente, e isto ocorreu sobretudo pela expansão das suas funções sociais. Porém, a cultura popular católica não é apenas uma cultura de imitação. É também uma cultura de excessos e exageros. E o Estado-Social em Portugal rapidamente foi levado ao exagero, a tal ponto que se encontra hoje falido.

Inovar por imitação é a forma fácil e falsa de inovar. A verdadeira inovação é a inovação na tradição. E qual é a tradição de assistência social em Portugal? É uma tradição que põe o Estado como a última instituição de assistência social – a instituição subsidiária -, e não como a primeira, como faz a tradição luterana alemã.

A tradição católica, no seu realismo, parte do princípio de que quem conhece melhor as necessidades dos carenciados são aqueles que lhes estão próximos. Por isso, a primeira instituição de assistência social é a família, seguindo-se o grupo de amigos, a freguesia, as associações sociais, profissionais e recreativas, o concelho, e só finalmente o Estado. A Igreja cruza transversalmente todas estas instituições, a sua acção de assistência exercendo-se desde o nível mais local da paróquia até ao nível nacional, passando pela diocese.

Quando um país perde o rumo, só existe um caminho seguro – a tradição. É certamente um bom sinal que o Governo tenha anunciado recentemente a sua intenção de devolver às Misericórdias doze hospitais que tinham sido nacionalizados com o 25 de Abril. Num país profundamente católico como é Portugal, o Estado nunca será, nem de longe, um concorrente sério da Igreja no exercício de funções sociais. Falta-lhe a experiência. Falta-lhe a tradição.


(Publicado no jornal A Ordem, Novembro 2011)

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