12 março 2011

uma cultura de capelas

Imagine uma grande capela possuindo dentro dela várias capelas de tamanhos intermédios mas variáveis, e dentro de cada uma destas muitas capelinhas de tamanho pequeno mas também variável. Um homem possui o poder supremo e absoluto sobre a grande capela, e portanto sobre todas as capelas de tamanhos intermédio e pequeno. Cada capela de tamanho intermédio e pequeno dispõe também de um homem possuindo sobre ela um poder que é supremo e absoluto. Cada um destes homens age por delegação do poder supremo e absoluto do chefe da grande capela. A grande capela é a Nação, as capelas intermédias são as grandes instituições da nação (educação, justiça, saúde, grandes empresas) e as pequenas capelas são as pequenas instituições da Nação (pequenas empresas, associações, famílias, etc.)
Visto por outra analogia: considere o Papa que tem poder supremo e absoluto sobre a Igreja - a grande capela. Depois os bispos que têm poder supremo e absoluto sobre as dioceses - as capelas intermédias. Finalmente os padres que têm poder supremo e absoluto sobre a paróquia. Cada um destes poderes absolutos é uma delegação do poder absoluto do Papa. Na diocese, o Papa delega o seu poder absoluto no bispo e este, por seu turno, delega-o no padre da paróquia.
Este é o modelo de organização natural da sociedade portuguesa.
Segundo este modelo, um homem e um homem só - o seu chefe - assume inteira responsabilidade pelo que se passa na sua capela. Nem poderia ser de outro modo. Se ele tem poder supremo e absoluto sobre a sua capela, a ele deve ser imputada a responsabilidade por tudo aquilo que de bom e de mau existe na capela. E isso significa que todos os outros habitantes da capela são irresponsáveis. Mais ninguém está habituado a assumir responsabilidade por coisa nenhuma.
Não se pode dizer que esta cultura seja um cultura de irresponsáveis. Aquilo que se pode dizer com propriedade é que esta é uma cultura onde um pequeno número de homens - os chefes de capela, a elite - carregam sobre si uma responsabilidade enorme, que é a contraparte do seu poder supremo e absoluto, ao mesmo tempo que a esmagadora maioria da população - o povo, os habitantes da capela - não tem responsabilidade nenhuma. A elite assume pelo povo aquilo que o povo não tem - sentido de responsabilidade.
Admita-se agora que este modelo de organização social hierárquico é substituído por um outro, democrático, de onde os chefes de capela são eliminados, e cada capela passa agora a ser governada pelo povo que a habita. Ora, aquilo que caracteriza o povo nesta cultura é não estar habituado a assumir responsabilidades, porque existe um chefe que as assume por ele. Portanto, esta comunidade vai agora tornar-se uma comunidade de irresponsáveis.
É este o estado em que se encontra Portugal.

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