14 março 2011

sonhar


Eu gostaria de retomar este post (que tem sido responsável por um considerável aumento das audiências do PC nos últimos dias, embora nunca por boas razões), para começar a especificar em que é que se traduz a ideia de que é necessário um aumento da virilidade ou dos valores masculinos na sociedade portuguesa actual.
Aqui tratarei do primeiro: a assumpção do sustento financeiro da casa, senão exclusivamente, ao menos principalmente pelo homem.
Nos últimos 30 anos, as mulheres portuguesas acorreram maciçamente ao mercado de trabalho, a tal ponto que Portugal possui hoje uma taxa de participação das mulheres na força de trabalho (49.5%) que é a 12ª maior de todo o mundo, e praticamente igual à dos homens (50.5%). São conhecidas algumas das consequências igualmente radicais desta alteração: a redução das taxas de nupcialidade, o aumento dos divórcios, a diminuição das taxas de natalidade, etc.. Não é este, porém, o ponto.
O ponto é que uma actividade que era essencialmente masculina - ter um emprego, trabalhar fora de casa, assegurar o sustento financeiro da família - foi, no espaço de uma geração, invadida por mulheres e, como é normal na nossa cultura, as coisas foram levadas ao exagero, ao ponto de Portugal se ter tornado um país onde o grau de feminização da força de trabalho é dos mais elevados do mundo.
Além dos trabalhos domésticos e dos cuidados dos filhos onde, nalguns casos (v.g., amamentação) ela é insubstituível, a mulher passou a ter também, numa posição igual à do homem, a responsabilidade pelo sustento da casa. O stress de responder às solicitações de criar uma família e às exigência do emprego deve ser tremendo para as mulheres que se encontram nesta situação. Imagina-se que uma mulher nestas condições não tem tempo para mais nada. E estamos chegados ao âmago da questão - o tempo.
Muito mais do que um homem, uma mulher precisa de ter tempo livre. Trata-se de um bem absolutamente essencial para uma mulher, e consideravelmente menos essencial para um homem. E precisa de ter tempo livre para quê, para cuidar de si? Sim, mas não apenas isso. Precisa de ter tempo livre para uma actividade muito mais importante - sonhar. Uma mulher precisa de ter tempo livre para sonhar os sonhos que os homens irão realizar para ela.
Aquilo que nós somos e até onde chegamos na vida foi determinado em primeiro lugar pelos sonhos das nossas mães. A nossa própria existência é o fruto dos sonhos delas. Mais geralmente, as grandes obras, frequentemente realizadas pelos homens, foram quase sempre e em primeiro lugar, sonhos de mulher.
Uma sociedade onde as mulheres deixaram de ter tempo para sonhar é uma sociedade paralisada, estéril, que não cria, que não cresce, que permanece eternamente na mesma - e é assim que está a sociedade portuguesa actual. Por isso, se um homem me confidenciasse que acaba de dizer à sua mulher: "Olha, eu vou passar a trabalhar mais, para que tu possas trabalhar menos e teres mais tempo livre para ti", eu só poderia reagir dizendo-lhe: "Isso é de homem!"

Sem comentários: