29 março 2011

reformulação fiscal

"Em resumo, uma alteração da estrutura de tributação que reduza as contribuições para a segurança social pagas pela entidade patronal por contrapartida de um aumento da tributação sobre o consumo – podendo ser complementada com uma transferência monetária para as famílias –, com impacto final neutro no saldo orçamental e na dívida pública, é susceptível de aumentar a competitividade da economia portuguesa, assim como os níveis de produto, consumo e emprego. A magnitude destes efeitos pode ser bastante substancial. Note-se, em particular, que um cenário de harmonização integral das taxas do IVA teria um impacto macroeconómico cerca de quatro vezes superior ao apresentado nesta caixa. Deste modo, importa reflectir mais aprofundadamente sobre as implicações de uma reforma fiscal com estas características, que pode ser particularmente relevante no actual quadro de ajustamento prolongado da economia portuguesa.", Banco de Portugal, Boletim Económico - Primavera 2011 (slide 40).

Se há relatórios cuja leitura me enche de prazer são os do Banco de Portugal, nomeadamente aqueles de cariz mais académico. E este que acabo de citar, publicado hoje no sítio do BdP, é um exemplo dessa excelência que, felizmente, aqui e acolá ainda vamos mantendo.

Ora, indo ao cerne da questão, o que os investigadores do Banco de Portugal propõem é o seguinte: aumentar 2 pontos percentuais ao IVA, reduzindo, em contrapartida, 4 pontos percentuais às Contribuições Sociais pagas pela entidade patronal. De acordo com as simulações daqueles técnicos, essa reformulação fiscal teria um impacto neutro no saldo orçamental e, por conseguinte, sobre o stock de dívida pública. Ao mesmo tempo, também não teria impacto sobre as exportações, sendo que, pelo contrário, seriam penalizadas as importações através do agravamento dos preços de consumo final. Em suma, a proposta, a ser implementada, conduziria, na prática, a uma desvalorização cambial real, à qual estaria ainda associada uma provável melhoria no número de horas trabalhadas, no emprego e, em última instância, uma melhoria dos salários.

Enfim, é este tipo de propostas que deveriam estar a ser apresentadas por Passos Coelho - já que falou em aumentar o IVA... - e que são muito distintas das tiradas avulsas que aquele candidato a Primeiro Ministro tem proferido. De resto, a proposta do BdP vai de encontro àquilo que eu próprio tenho defendido e escrito nos últimos anos: se o problema crónico da economia portuguesa reside no consumo excessivo (face à poupança acumulada) e no elevado défice da Balança de Transacções Correntes, actualmente em cerca de 10% do PIB, então, a solução é aumentar os impostos indirectos, reduzindo os impostos directos numa proporção ainda maior. Mas é claro: isto só funciona se, em simultâneo, emagrecermos o peso do Estado...E esta é a parte do diagrama que nenhum dos intervenientes políticos deste Regime conseguiu ainda fazer.

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