06 julho 2010

Imprensa escrita (II)


A manchete de ontem do jornal "i" demonstra bem a encruzilhada em que se encontra a imprensa escrita em Portugal e a forma como todos, uns mais e outros menos, continuam em busca de uma solução para a crise que se vive no sector. Mas como, ainda esta manhã, comentava o proprietário da papelaria onde todos os dias compro os meus jornais, as publicações ditas "sérias" são cada vez menos procuradas. Hoje, excepcionalmente, comprei o Público - para ler a entrevista de Ricardo Salgado -, coisa que já não fazia há muitos meses. De resto, da minha rotina diária, constam apenas o "Jornal de Negócios" e o "Diário Económico", para além dos internacionais que, cada vez mais, gosto de ler.

Regressando ao "i" que nasceu envolto de grandes expectativas, mas que, recentemente, quase implodiu, ontem, decidiu jogar no campeonato do sensacionalismo publicando uma manchete - "Governo prepara maior corte de sempre nos salários da função pública" - que, mais tarde, revelou-se enganosa. Nesse artigo, o jornalista indicava que o Governo promoveria uma redução nominal da massa salarial pública em 4%, 2,4% e 2,6% em 2011, 2012 e 2013, respectivamente. Ou seja, dava a entender que seriam aquelas as reduções médias dos salários na função pública. Horas mais tarde, na sequência de uma conferência de imprensa do Governo, convocada exclusivamente para repudiar a insinuação daquela notícia, o "i" actualizava a notícia com um "follow up", mantendo um título semelhante, mas em que, a páginas tantas, já misturava salários nominais com o indexante de actualização. E hoje volta à carga com o mesmo assunto, mas explorando outra avenida que não a da massa salarial. Enfim, o "i" a tentar descalçar a bota...

Devo dizer o seguinte: estou francamente convencido de que, mais cedo ou mais tarde, a redução salarial irá mesmo acontecer, por isso, acredito que, eventually, o "i" terá razão. Mas isso não invalida a forma como a manchete foi dada, na minha opinião, exagerada, com o simples propósito de vender papel. De resto, não é a primeira que tal acontece, pois recordo-me de uma outra manchete no "i", a propósito do Banco Finantia, essa (ao contrário desta) totalmente injustificada e despropositada - a notícia já tinha dois meses - e que, na altura, resultou em forte (e justo) protesto daquele banco junto do director do "i". Ou seja, este estilo sensacionalista não me agrada e penso que não agradará à generalidade dos leitores dos jornais ditos "sérios". É um estilo que funciona em matérias de "faca e alguidar", como tão bem o faz o "Correio da Manhã" e, cada vez mais, o "Jornal de Notícias" e que, quiçá, é o único domínio onde a imprensa diária escrita conseguirá sobreviver. Agora, aquele mesmo estilo nos segmentos aos quais se dirigem o "Público" ou o "i" não sei não...

Enfim, eu insisto naquilo que já aqui escrevi antes: hoje em dia, os jornais, quer os diários quer os semanários, valem quase que exclusivamente pelos seus colunistas e editorialistas. Gente como o Pedro Guerreiro, o João Silva, o Camilo Lourenço, o Pedro Sousa Carvalho, o Daniel Amaral, o José Eduardo Moniz, o Miguel Sousa Tavares, o Miguel Monjardino, o Vasco Pulido Valente, o João Carlos Espada, o Eduardo Dâmaso, entre tantos outros que, sobre os mais variados temas, ainda, vão escrevendo na imprensa escrita. Quanto à pequena notícia, aquela que se encontra em todo o lado e que é actualizada minuto a minuto na internet, essa não tem rigorosamente interesse nenhum. Mas, infelizmente, é ainda este tipo de conteúdo que constitui a espinha dorsal da imprensa dita "séria". Por quanto tempo mais?

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