Também publicado aqui.
Existem algumas facetas verdadeiramente admiráveis na Revolução Francesa, que constituem impressionantes lições de História e de Política. Desde logo, a sucessão de acontecimentos e de factos ocorridos entre 1789 e 1795 revela um sem número de erros, disparates e imprudências políticas com consequências trágicas, para as quais o liberalismo clássico não se cansa de alertar.
A mais evidente lição de todas é a dos resultados não pretendidos das acções humanas. Sobretudo quando estas dispõem de poder político, isto é, da capacidade de tomar decisões que influenciam milhares de indivíduos. Não restam dúvidas para ninguém que conheça minimamente a história deste período, que a maioria dos líderes da Revolução estava animada de boas intenções: quase todos queriam sinceramente o bem da França e dos franceses, o desenvolvimento do país e a criação de um regime constitucional assente nos princípios da liberdade e da igualdade de todos perante a lei. Todavia, os resultados das suas acções foram exactamente o oposto dos desejados: terror, violência, desrespeito pelos direitos individuais mais elementares e, na generalidade, a supressão de todas as liberdades antigas do Reino. A lição a recolher daqui é evidente: não bastam as boas intenções para que a acção política dê bons resultados. Hayek explicaria isso mais tarde e sintetizaria o princípio dizendo que somos mais o resultado dos nossos actos do que das nossas intenções. E mesmo em França, pouco após o início do ciclo napoleônico, Frédéric Bastiat explicaria, com simplicidade, as consequências não previstas nem pretendidas do comportamento dos agentes políticos. Em França, durante a Revolução Francesa, os seus dirigentes dispuseram de um poder que nunca deveria ter estado ao seu alcance. Exerceram-no para atingir o bem do seu país e dos seus concidadãos. Obtiveram o resultado exactamente inverso.
Outra lição importante, que pode ser vista como um corolário da anterior, é a de que homens comuns podem causar danos extraordinários, se tiverem à sua disposição um aparelho de poder sofisticado e um governo sem limites. Na verdade, os principais protagonistas da Revolução são pessoas normais. Nenhuma delas é uma figura excepcional, e muitas estavam bem abaixo das capacidades humanas médias. Robespierre é um leitor vulgar de Rousseau e dos Enciclopedistas, que assimilou mal e divulgou ainda pior. Não dispunha de especiais talentos oratórios, nem de uma inteligência fulgurante. Era obsessivo e pertinaz nos seus objectivos, mas era imensamente cobarde e não dava o rosto por eles. Para além do mais, pelo menos a partir de um certo período, desenvolveu uma personalidade neurótica e esquizofrénica, permanentemente perseguido por complôs imaginários e conspirações inexistentes. Danton era um rufião inteligente e capaz, mas com uma personalidade duvidosa e que deixava muito a desejar. Venal, deixava-se seduzir facilmente pelo dinheiro, tendo-se envolvido em inúmeras situações mais do que duvidosas, que os seus adversários exploraram até à exaustão. Não tinha escrúpulos, nem era propriamente um defensor de princípios. No fim da sua vida deixou-se derrotar infantilmente e, assim, condenou-se e condenou irresponsavelmente os seus amigos à morte. Mirebeau era um homem superiormente inteligente, mas um charlatão. Liderava a Revolução enquanto se vendia à coroa. Movido por alguns princípios e, sobretudo, por objectivos políticos razoáveis, condenava-os em troca de um prato de lentilhas. A sua morte radicalizou a Revolução, mas é mais do que duvidoso que a tivesse conseguido suster, caso vivesse alguns anos mais. Saint-Just é um jovem delinquente, com uma personalidade fortemente psicopata. Quando tinha 19 anos a sua mãe viu-se obrigada a interná-lo numa casa de correcção, dado o seu comportamento violento e insubmisso. Mais tarde, já na Revolução, toma atitudes desumanas e desrespeitadoras dos mais elementares direitos individuais que dizia proteger. Em “homenagem” ao seu carácter, Michelet pôs-lhe a sinistra alcunha do “Arcanjo da Morte”. Desmoulins não passava de um jornalista incendiário, com deficiências de carácter muito acentuadas. Brissot, que tinha sido, em jovem, um aventureiro inescrupuloso, foi um político também sem escrúpulos e que se orientava exclusivamente ao sabor do que pensava serem as suas conveniências. Collot d’Herbois fora um medíocre actor de teatro e desempenhou, na Revolução, o papel de um psicopata sanguinário que se orgulhava de massacrar “traidores”. Billaud-Varenne era um medíocre, com uma personalidade violenta e sem escrúpulos. Fouquier-Tinville não passava de um tratante capaz das maiores pusilanimidades. Mme. Roland era uma arrivista esperta, mas com vistas muito limitadas, tão limitadas que acabaria no cadafalso, graças a elas. E poderíamos continuar a lista sem garantidamente encontrar uma personagem de excepção. Todavia, foram estes homens vulgares, talvez até demasiadamente vulgares, que provocaram acontecimentos extraordinários, o que demonstra que as consequências do exercício do poder dependem menos de quem o exerce, do que da sua própria natureza.
A Revolução Francesa é, assim, um inesgotável repositório histórico de lições sobre política, sobretudo para aprendermos aquilo que nunca devemos fazer ou deixar que nos façam. É, por consequência, uma eloquente demonstração da necessidade de um poder público mínimo e o mais controlado que for possível
Existem algumas facetas verdadeiramente admiráveis na Revolução Francesa, que constituem impressionantes lições de História e de Política. Desde logo, a sucessão de acontecimentos e de factos ocorridos entre 1789 e 1795 revela um sem número de erros, disparates e imprudências políticas com consequências trágicas, para as quais o liberalismo clássico não se cansa de alertar.
A mais evidente lição de todas é a dos resultados não pretendidos das acções humanas. Sobretudo quando estas dispõem de poder político, isto é, da capacidade de tomar decisões que influenciam milhares de indivíduos. Não restam dúvidas para ninguém que conheça minimamente a história deste período, que a maioria dos líderes da Revolução estava animada de boas intenções: quase todos queriam sinceramente o bem da França e dos franceses, o desenvolvimento do país e a criação de um regime constitucional assente nos princípios da liberdade e da igualdade de todos perante a lei. Todavia, os resultados das suas acções foram exactamente o oposto dos desejados: terror, violência, desrespeito pelos direitos individuais mais elementares e, na generalidade, a supressão de todas as liberdades antigas do Reino. A lição a recolher daqui é evidente: não bastam as boas intenções para que a acção política dê bons resultados. Hayek explicaria isso mais tarde e sintetizaria o princípio dizendo que somos mais o resultado dos nossos actos do que das nossas intenções. E mesmo em França, pouco após o início do ciclo napoleônico, Frédéric Bastiat explicaria, com simplicidade, as consequências não previstas nem pretendidas do comportamento dos agentes políticos. Em França, durante a Revolução Francesa, os seus dirigentes dispuseram de um poder que nunca deveria ter estado ao seu alcance. Exerceram-no para atingir o bem do seu país e dos seus concidadãos. Obtiveram o resultado exactamente inverso.
Outra lição importante, que pode ser vista como um corolário da anterior, é a de que homens comuns podem causar danos extraordinários, se tiverem à sua disposição um aparelho de poder sofisticado e um governo sem limites. Na verdade, os principais protagonistas da Revolução são pessoas normais. Nenhuma delas é uma figura excepcional, e muitas estavam bem abaixo das capacidades humanas médias. Robespierre é um leitor vulgar de Rousseau e dos Enciclopedistas, que assimilou mal e divulgou ainda pior. Não dispunha de especiais talentos oratórios, nem de uma inteligência fulgurante. Era obsessivo e pertinaz nos seus objectivos, mas era imensamente cobarde e não dava o rosto por eles. Para além do mais, pelo menos a partir de um certo período, desenvolveu uma personalidade neurótica e esquizofrénica, permanentemente perseguido por complôs imaginários e conspirações inexistentes. Danton era um rufião inteligente e capaz, mas com uma personalidade duvidosa e que deixava muito a desejar. Venal, deixava-se seduzir facilmente pelo dinheiro, tendo-se envolvido em inúmeras situações mais do que duvidosas, que os seus adversários exploraram até à exaustão. Não tinha escrúpulos, nem era propriamente um defensor de princípios. No fim da sua vida deixou-se derrotar infantilmente e, assim, condenou-se e condenou irresponsavelmente os seus amigos à morte. Mirebeau era um homem superiormente inteligente, mas um charlatão. Liderava a Revolução enquanto se vendia à coroa. Movido por alguns princípios e, sobretudo, por objectivos políticos razoáveis, condenava-os em troca de um prato de lentilhas. A sua morte radicalizou a Revolução, mas é mais do que duvidoso que a tivesse conseguido suster, caso vivesse alguns anos mais. Saint-Just é um jovem delinquente, com uma personalidade fortemente psicopata. Quando tinha 19 anos a sua mãe viu-se obrigada a interná-lo numa casa de correcção, dado o seu comportamento violento e insubmisso. Mais tarde, já na Revolução, toma atitudes desumanas e desrespeitadoras dos mais elementares direitos individuais que dizia proteger. Em “homenagem” ao seu carácter, Michelet pôs-lhe a sinistra alcunha do “Arcanjo da Morte”. Desmoulins não passava de um jornalista incendiário, com deficiências de carácter muito acentuadas. Brissot, que tinha sido, em jovem, um aventureiro inescrupuloso, foi um político também sem escrúpulos e que se orientava exclusivamente ao sabor do que pensava serem as suas conveniências. Collot d’Herbois fora um medíocre actor de teatro e desempenhou, na Revolução, o papel de um psicopata sanguinário que se orgulhava de massacrar “traidores”. Billaud-Varenne era um medíocre, com uma personalidade violenta e sem escrúpulos. Fouquier-Tinville não passava de um tratante capaz das maiores pusilanimidades. Mme. Roland era uma arrivista esperta, mas com vistas muito limitadas, tão limitadas que acabaria no cadafalso, graças a elas. E poderíamos continuar a lista sem garantidamente encontrar uma personagem de excepção. Todavia, foram estes homens vulgares, talvez até demasiadamente vulgares, que provocaram acontecimentos extraordinários, o que demonstra que as consequências do exercício do poder dependem menos de quem o exerce, do que da sua própria natureza.
A Revolução Francesa é, assim, um inesgotável repositório histórico de lições sobre política, sobretudo para aprendermos aquilo que nunca devemos fazer ou deixar que nos façam. É, por consequência, uma eloquente demonstração da necessidade de um poder público mínimo e o mais controlado que for possível
Sem comentários:
Enviar um comentário