13 julho 2009

o vencedor


Uma das características da cultura católica que tenho vindo a enfatizar é a sua enorme capacidade para se declarar sempre do lado vencedor. Esta característica ela legou aos povos que estiveram durante séculos sob a sua influência exclusiva. O apoio maciço da população hondurenha e da Igreja ao golpe que recentemente ocorreu no país está aí para ilustrar (se o desfecho do golpe tivesse sido outro, o apoio da população e da Igreja também teria sido outro).

A estratégia é conhecida e perfeitamente identificável. Perante um confronto actual ou potencial, a Igreja coloca um pé em cada lado, não toma partido decisivamente por nenhuma das partes, e aguarda o desfecho do confronto. Depois, declara-se do lado dos vencedores e até aponta os apoios que sempre lhes prestou e até nomeia os seus homens que sempre estiveram desse lado.

Como estratégia de sobrevivência é infalível. Mas tem um custo. Torna a Igreja, e os povos sujeitos à sua influência, extremamente conservadores. Andam atrás da civilização, em lugar de correrem à frente dela. Liderar a civilização foi aquilo que a Igreja fez nos seus primeiros séculos de existência quando o Império Romano ruiu e a civilização ficou à deriva. Agora já não consegue.

A recente encíclica do Papa sobre os problemas económicos e sociais dos nossos tempos não traz nada de novo. Para quem não segue atentamente a doutrina social da Igreja, talvez possa parecer surpreendente o apreço da Igreja pelo processo do mercado e pela globalização, não sem que, logo depois, submeta o mercado e a globalização a um controlo político, sob a forma de um governo mundial.

O ponto que me ocupa aqui, porém, é o do apreço da Igreja pelo processo do mercado. Não é novo, mas é muito recente. Data de 1991 e da Encíclica Centesimus Annus. Até aí, a doutrina social da Igreja que nesse ano comemorou o seu primeiro centenário, tinha sempre expressado uma ambivalência permanente entre o capitalismo e o socialismo como sistemas de organização económica e social, criticando um e outro, e defendendo a superioridade de uma "terceira via" que, na prática, permaneceu sempre um segredo muito bem guardado.

Só em 1991, exactamente cem anos após a Encíclica Rerum Novarum de Leão XIII, a Igreja concluiu que o capitalismo era melhor que o socialismo. Alguma revelação? Não, o muro de Berlim tinha acabado de ruir e a experiência tinha mostrado qual era o sistema vencedor.

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