21 julho 2009

Enfermaria


Nos últimos anos, se há sector no Estado que evoluiu significativamente, em termos de produtividade, esse sector foi o do Fisco. É certo que o fez à custa de mil e uma tropelias inconstitucionais (pobre Constituição Portuguesa, violada todos os dias), mas resultados são resultados. Enfim, já dizia a sabedoria popular que a necessidade faz o engenho!

Pois agora, parece que também a Segurança Social está a acordar para a realidade. O Jornal de Negócios de hoje traz a seguinte manchete: "Segurança Social ajuda empresas com dívidas a encontrar investidores". De acordo com a notícia, o Serviço de Apoio ao Investidor e à Viabilização Empresarial, gerido pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS), arranca oficialmente em Setembro e parte com o objectivo de "conseguir viabilizar as sociedades em dificuldades e, desse modo, garantir a recuperação das dívidas à Previdência". Acrescenta o jornal que "o IGFSS já assinou protocolos com instituições financeiras e empresas de capital de risco (...) existem também protocolos com consultores estratégicos e financeiros que, em caso de necessidade, podem intervir na definição do modelo de negócio futuro da empresa".

Em suma, a ideia está muito bem pensada, em particular num país como Portugal onde o capital de risco, ao contrário do que devia, apenas refinancia e recapitaliza a "enfermaria" e onde os cidadãos revelam uma especial propensão ao abrigo junto do Estado. E não existe qualquer ironia nestas palavras. É apenas a constatação da realidade, com uma nota adicional: ao contrário dos privados, o Estado poderá mesmo obrigar os devedores a sentarem-se à mesa e a não passarem a perna a ninguém. Tenho apenas uma dúvida: qual será o engodo a utilizar junto dos detentores de capital disponível? Isenções fiscais? Ou outro tipo de vantagens? É que não há almoços de borla!

Contudo, onde eu vejo mais espaço para a ironia é na forma como serão estabelecidos os protocolos com os consultores estratégicos e financeiros. Se a coisa for feita com transparência e critério, óptimo. Se, pelo contrário, for por "ajuste directo", péssimo. Neste último cenário, tratar-se-ia de concorrência desleal entre privados: entre aqueles que pululam na órbita do Estado e aqueles, como acontece com centenas de pequenas empresas de consultoria espalhadas pelo país inteiro, que fazem da consultadoria de gestão o seu negócio do dia a dia - muitas vezes junto de PME's em dificuldades, acumulando honorários em atraso. Portanto, é obrigatória que essa subcontratação de serviços seja feita com rigor. E é preciso que as empresas sujeitas a intervenção independente sigam as recomendações dos consultores, que não façam aquilo que a Aerosoles fez com o célebre estudo da Roland Berger, certamente pago à Cristiano Ronaldo e que foi para o lixo (também não seria de esperar outra coisa, em face daquelas conclusões!).

Tratada a "enfermaria", só falta arrancar com o "berçário". Mas, neste campo, é preferível que o Estado não se intrometa. Faça como qualquer homem deve fazer na altura do parto: assista, mas afaste-se. E, depois, deixe que seja a mãe a cuidar da cria!

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