Dificilmente encontraremos uma prova mais evidente da existência da ordem social espontânea, em Portugal, do que na sua gastronomia. O problema coloca-se nos termos que se seguem.
As pessoas precisam de comer para viver e gostam de comer. De preferência bem ou mesmo muito bem. Para isso carecem de recursos e de saber administrá-los. Têm que puxar pela imaginação, de inventariar existências, conceber soluções, encontrar produtos finais que lhes agradem. Numa economia pobre como a nossa, a cozinha de origem popular (e quase toda a cozinha tem origem popular) não podia senão realizar-se através dos parcos recursos disponíveis. Por isso, a nossa gastronomia baseia-se em produtos próprios de uma economia de subsistência: o porco, o pão, os ovos, as ervas aromáticas, o peixe disponível, alguns frutos. O modo de os trabalhar demonstra duas coisas: a imaginação e a criatividade dos portugueses, quando deixados a si mesmos; e o bom resultado que dão as práticas sociais espontâneas, neste caso resultantes da troca de informação, da livre experimentação e da tradição acumulada. Os nossos produtos gastronómicos só não são susceptíveis de universalização, não pela eventual riqueza dos seus ingredientes, como diz o Pedro, mas pela sua quase exclusividade no território português. Por exemplo, é impossível fazer grande parte dos nossos pratos sem enchidos. Os enchidos carecem de fumeiro. O fumeiro não prescinde de um clima sazonalmente frio. Outro exemplo: o azeite. Sem ele a gastronomia portuguesa não existiria. O azeite vem da azeitona. A azeitona da oliveira. A oliveira não pega em qualquer tipo de clima e de solo. É, por conseguinte, impossível exportar as nossas receitas para climas excessivamente quentes, ou excessivamente frios, que, como sabemos, predominam no planeta.
Enquanto o estado não penetrou na cozinha portuguesa, ela foi sempre progredindo e melhorando. Hoje, graças a uma interpretação burocrática e estatista das normas alimentares da União Europeia, que, por exemplo, a Espanha muito sensatamente não seguiu, o estado português começou a invadir e a estragar a nossa gastronomia. Fê-lo limitando seriamente a liberdade de cozinhar dos nossos restaurantes, vistos como espaços públicos - que não são - onde o estado devia intervir e que tinha a obrigação de fiscalizar. Já começou mesmo até a atacar a confecção de muitos dos nossos alimentos, como a composição do pão português, que alimentou e alimentou muito bem, gerações e gerações de patriotas.
Em consequência disto, muitas das nossas tradições gastronómicas começaram a ser, num passado recente, francamente ameaçadas. Ainda assim, na clandestinidade das nossas cozinhas domésticas, a ordem espontânea gastronómica portuguesa continua a resistir. Esperemos que ela consiga vencer mais esta onda de estatismo
P.S.: Sobre o tema, sugiro a leitura deste preocupante post.
As pessoas precisam de comer para viver e gostam de comer. De preferência bem ou mesmo muito bem. Para isso carecem de recursos e de saber administrá-los. Têm que puxar pela imaginação, de inventariar existências, conceber soluções, encontrar produtos finais que lhes agradem. Numa economia pobre como a nossa, a cozinha de origem popular (e quase toda a cozinha tem origem popular) não podia senão realizar-se através dos parcos recursos disponíveis. Por isso, a nossa gastronomia baseia-se em produtos próprios de uma economia de subsistência: o porco, o pão, os ovos, as ervas aromáticas, o peixe disponível, alguns frutos. O modo de os trabalhar demonstra duas coisas: a imaginação e a criatividade dos portugueses, quando deixados a si mesmos; e o bom resultado que dão as práticas sociais espontâneas, neste caso resultantes da troca de informação, da livre experimentação e da tradição acumulada. Os nossos produtos gastronómicos só não são susceptíveis de universalização, não pela eventual riqueza dos seus ingredientes, como diz o Pedro, mas pela sua quase exclusividade no território português. Por exemplo, é impossível fazer grande parte dos nossos pratos sem enchidos. Os enchidos carecem de fumeiro. O fumeiro não prescinde de um clima sazonalmente frio. Outro exemplo: o azeite. Sem ele a gastronomia portuguesa não existiria. O azeite vem da azeitona. A azeitona da oliveira. A oliveira não pega em qualquer tipo de clima e de solo. É, por conseguinte, impossível exportar as nossas receitas para climas excessivamente quentes, ou excessivamente frios, que, como sabemos, predominam no planeta.
Enquanto o estado não penetrou na cozinha portuguesa, ela foi sempre progredindo e melhorando. Hoje, graças a uma interpretação burocrática e estatista das normas alimentares da União Europeia, que, por exemplo, a Espanha muito sensatamente não seguiu, o estado português começou a invadir e a estragar a nossa gastronomia. Fê-lo limitando seriamente a liberdade de cozinhar dos nossos restaurantes, vistos como espaços públicos - que não são - onde o estado devia intervir e que tinha a obrigação de fiscalizar. Já começou mesmo até a atacar a confecção de muitos dos nossos alimentos, como a composição do pão português, que alimentou e alimentou muito bem, gerações e gerações de patriotas.
Em consequência disto, muitas das nossas tradições gastronómicas começaram a ser, num passado recente, francamente ameaçadas. Ainda assim, na clandestinidade das nossas cozinhas domésticas, a ordem espontânea gastronómica portuguesa continua a resistir. Esperemos que ela consiga vencer mais esta onda de estatismo
P.S.: Sobre o tema, sugiro a leitura deste preocupante post.
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