26 março 2009

o mal

O Pedro Arroja anda preocupado com a verdade. O Pedro é um intelectual brilhante, culturalmente formado numa sociedade protestante, habituado aos valores da tolerância, da liberdade de pensamento, da livre expressão e do debate de ideias incondicionado. Se alguma faceta do seu carácter veio ao de cima nos seus já muitos anos de vida pública, ela terá sido a de ter sido sempre fiel à sua verdade. Foi por isso que teve e continua a ter de pagar um preço elevado. Ao que julgo, não se importa excessivamente com isso.

Como um bom estrangeirado que não compreende o país do qual se exilou longamente, e ao qual acabou por regressar por absurda nostalgia, o meu amigo Pedro Arroja foi sempre contestado e agredido quando pretendia apenas debater a sua verdade. É disso que ele se queixou e continua a queixar, com inteira razão, diga-se. A sociedade portuguesa não é tolerante, não procura a verdade, e não suporta homens livres que pensam livremente. A sociedade portuguesa limita-se a vegetar mentalmente para tentar sobreviver, e na selva a verdade é muito pouco conveniente.

Eu, por mim, continuo a pregar a virtude do racionalismo céptico.Acredito que a sociedade portuguesa se encontra submergida num lodaçal ético e moral, cujas origens históricas e os parâmetros temporais não sou capaz de determinar. Não me refiro, obviamente, à dita corrupção da classe política e à absoluta ausência de valores éticos de quem nos governa. Essa é a espuma dos dias, dos nossos dias, e interessa muito pouco ou mesmo nada. Por mim, como conservador racionalista e pessimista que me sinto cada vez mais, é o que vejo à minha volta que me preocupa e não tanto o que paira lá por cima. O que me apoquenta é a cultura social portuguesa, a mentalidade dominante que enferma cada vez mais o nosso código genético. E essa mentalidade é verdadeiramente assustadora. Vive do escândalo e do sobressalto. Carece do nojo para injectar adrenalina. Por exemplo: o escândalo da pobre miúda de doze anos, deficiente mental, sexualmente abusada por um bando de filhos-da-puta retardados mentais que, utilizando os modernos prodígios da tecnologia, filmaram e divulgaram a repelência. Numa sociedade comparativamente civilizada, por exemplo, no Irão, os ditos cavalheiros seriam certamente executados de modo exemplar e não se falava mais nisso. Em Portugal, a coisa é objecto de “exemplar” e reiterado tratamento noticioso, para saciar a gula alarve dos nossos concidadãos e vender jornais e aumentar audiências.

É disto, é destas “verdades” que vivem os portugueses. Verdadeiramente, os portugueses não vivem. Viver pressupõe um exercício de autonomia e de liberdade que os portugueses desconhecem por inteiro. Aqui rasteja-se no lodo e na escandaleira. Aqui nenhuma verdade existe.

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